Dois anos após ser eleito governador de Santa Catarina, Jorginho Mello (PL) segue apostando no bolsonarismo, com sanção de leis conservadoras e alfinetadas no governo federal, enquanto passa por desgastes variados – de parcerias milionárias feitas sem licitação a representações por suposto crime de racismo.
Em entrevistas, Jorginho tem defendido uma espécie de anistia a Bolsonaro, para que ele possa disputar as próximas eleições ao Planalto.
Condenado pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral), Bolsonaro está inelegível até outubro de 2030. Apesar disso, segue se colocando como possível candidato da direita para o pleito de 2026. Para o governador, a condenação é injusta.
No final do ano passado, um dia após o indiciamento de Bolsonaro pela PF no inquérito que apura golpe de Estado em 2022, Jorginho foi às redes sociais dar apoio ao aliado: “O Brasil reconhece quem lutou pela pátria, família e liberdade. Aqui em Santa Catarina, o compromisso com os valores que nos unem é inabalável”, escreveu.
Outros governadores aliados preferiram o silêncio.
Em Santa Catarina, o PL de Bolsonaro tem força e saiu robusto das eleições de 2024. A legenda levou 90 prefeituras entre 295 municípios. Na capital Florianópolis, a vice-prefeita Maryanne Mattos é do PL, em uma aliança com o PSD do prefeito Topázio Neto.
Aliados acreditam que, na esteira do desempenho eleitoral, o tom do discurso não deve arrefecer na metade final do mandato.
Ao longo da gestão, Jorginho tem feito sinalizações ao eleitorado conservador. Disse, por exemplo, ter negado patrocínio do governo estadual à parada LGBT+ de Florianópolis sob argumento de que “não financiar pautas ideológicas”.
Também tem sancionado leis como a que veda, nas escolas da rede estadual, a “execução de músicas e videoclipes com letras e coreografias que façam apologia ao crime, ao uso de drogas, ou expressem conteúdos verbais e não verbais de cunho sexual e erótico”.
Jorginho é defensor do modelo de escola cívico-militar, exaltado pelo ex-mandatário.
Foram sancionadas em 2024 também leis para multar consumo de maconha em espaços públicos e anistiar professores que se recusaram a se vacinar na pandemia da Covid-19.
O pacote também inclui alfinetadas no governo Lula (PT). A possibilidade de transferência da Autoridade Portuária de Itajaí (SC) para Santos (SP) foi o conflito mais recente. “Estou indignado com a decisão do governo federal. O PT de Santa Catarina não podia fazer esta sacanagem”, disse Jorginho, em dezembro.
Houve outros estremecimentos na relação com Brasília ao longo do mandato. Em agosto passado, chamou atenção a ausência do governador catarinense em visita do presidente Lula pelo estado.
“Inaugurar uma obra privada atrasada há 12 anos? Isso não precisa de palanque nem de faixa. O contorno viário da Grande Florianópolis já deveria ter sido liberado há dias. Aguardo o dia em que o governo federal venha destravar obras públicas que são de inteira responsabilidade de Brasília”, respondeu Jorginho, na ocasião.
“Entregamos 100 para Brasília e recebemos 10” é uma das frases mais repetidas por ele, ao falar da necessidade de revisão do pacto federativo.
Desde o final do ano passado, Jorginho vem enfrentando desgastes no próprio quintal, como as suspeitas de irregularidades em parcerias milionárias com empresas, sem licitação. Ele nega problemas, mas nomes em postos de comando já tiveram que deixar seus cargos após repercussão.
Além disso, Jorginho também pode se tornar alvo da PGR (Procuradoria-Geral da República), que recebeu representações contra o governador apontando crime de racismo.
Em janeiro, quando participava da abertura da 40ª edição da Festa Pomerana, em Pomerode, Jorginho afirmou durante uma entrevista que a cidade “se destaca pela beleza turística que tem, pelas casas enxaimel, pela cor da pele das pessoas, pela mistura”.
A cidade, que é vizinha a Blumenau, costuma ser chamada de a “cidade mais alemã do Brasil”.
Questionada pela reportagem sobre o andamento das representações, a PGR afirmou que o caso tramita sob sigilo. Em suas redes sociais, Jorginho afirmou que é “lamentável a tentativa de distorcer o conteúdo de uma entrevista que concedi”. “Racismo é crime, e essa acusação não se aplica a mim”, declarou ele.
Também em janeiro, outra declaração de Jorginho à imprensa foi parar na mira do STF (Supremo Tribunal Federal). O governador disse na Jovem Pan News que o presidente nacional de seu partido, Valdemar Costa Neto, mantinha contato com Bolsonaro.
Os dois correligionários estão proibidos de se falar desde fevereiro do ano passado, quando o ministro Alexandre de Moraes vetou a comunicação entre todos os investigados no inquérito que apura uma suposta tentativa de golpe de Estado em 2022.
Depois da fala, o ministro determinou que a Polícia Federal interrogue o governador para esclarecer se o ex-presidente violou medidas restritivas impostas pela corte.
Procurado por meio de sua assessoria, o governador não quis se manifestar.
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