Por Jeferson Miola
Durante a presidência do bolsonarista Roberto Campos Neto no Banco Central/BC, o ministro Fernando Haddad criticava os juros altos.
“Você não vai corrigir a inflação de 2024 aumentando o juro. Você tem que ver a trajetória da inflação ao longo dos meses para saber qual é o remédio adequado para conter eventualmente preços”, declarou Haddad em entrevista em agosto de 2024 reagindo à elevação da taxa de juros para 10,5% no mês anterior.
Mas agora, com Gabriel Galípolo liderando a maioria da direção do Banco Central indicada pelo governo Lula, Haddad matizou seu entendimento: –“o remédio para corrigir a inflação é, muitas vezes, aumentar a taxa de juros para inibir a alta de preços”, disse ele em entrevista recente [7/2/2025].
Afinal, qual das duas terapias avaliadas por Haddad seria recomendável?
Aquela que refuta o aperto monetário, pois considera que o aumento dos juros não seria “remédio adequado para conter eventualmente preços” [agosto/24], e sim um veneno; ou aquela terapia que prescreve o “aumento da taxa de juros para inibir a alta de preços” [fevereiro/25]?
Na opinião do prêmio Nobel de Economia Joseph Stiglitz, “aumentar as taxas de juros não resolve os problemas do lado da oferta”.
O economista entende que juro elevado “pode até piorar, porque o que precisamos fazer agora é investir mais nos gargalos do lado da oferta”. E “aumentar os juros dificulta a realização desses investimentos” necessários para aumentar a oferta e, assim, baixar os preços.
“Como que o aumento de juros vai levar a mais alimentos, mais energia e resolver o problema de escassez de microprocessadores? Não vai de jeito nenhum”, adverte Stiglitz, acrescentando que “o risco real é que isso piore as coisas” [entrevista na Alemanha, em agosto/2022].
No programa Roda Viva [16/10/2023] Stiglitz explicou a qualidade distinta da inflação que na atualidade afeta todas economias do planeta – que é de oferta, não de demanda.
“A inflação atual é diferente da inflação normal. Essa inflação, a inflação pós-pandemia, é diferente da inflação que o Brasil e o mundo tiveram no passado. Esta é sobretudo uma inflação do lado da oferta”, explica, acrescentando que, neste caso, “juros altos são contraprodutivos. Eles pioram a situação”.
“O fato básico é que a inflação atual não é causada por um excesso da procura agregada”, mas no lado da oferta e respectivos custos aumentados desde a pandemia.
Stiglitz exemplifica isso em relação ao aumento dos preços imobiliários nos EUA. Para ele, o “remédio” para conter os altos preços imobiliários seria “construir mais moradias. O que a alta taxa de juros faz? Dificulta isso. Portanto, ela exacerba o problema”.
Em outro exemplo, sobre o impacto inflacionário nos EUA causado pela escassez de chips para a indústria automobilística, Stiglitz recorda que o setor não planejou a compra de chips para a produção, “e os fabricantes de chips mandaram sua produção para outras indústrias”.
Quando a indústria automobilística fez novos pedidos, “os fabricantes de chips avisaram que ia demorar, mas foi só uma questão de tempo até que esses chips começassem a chegar”.
Instigante, Stiglitz questiona: “Foram os juros altos que levaram ao aumento da produção de chips? Não. Foi só uma questão de tempo, e então a produção de carros voltou, os estoques cresceram e o preço dos carros baixou”.
Outro fator que influencia a inflação no mundo em distintos graus é a guerra na Ucrânia. O conflito causou aumento do preço mundial do petróleo e, para o Brasil, afetou o preço dos fertilizantes. Stiglitz então pergunta: “aumentar a taxa de juros resolveria o problema da escassez de petróleo?”, e emenda a resposta: “Não”.
Na participação em seminário promovido pelo BNDES em março de 2023, Stiglitz disse que “a taxa de juros do Brasil é chocante. Uma taxa de 13,75%, ou 8% real, é o tipo de taxa de juros que vai matar qualquer economia. É impressionante que o Brasil tenha sobrevivido a isso, que seria uma pena de morte”.
Como disse certa vez o presidente Lula, “não existe nenhuma justificativa para a taxa de juros a 13,5%, é só ver a carta do Copom para ver a vergonha que é esse aumento de juros e a explicação que deram para sociedade brasileira”.
Se confirmar a projeção da última Ata do Banco Central, os juros poderão ultrapassar os 15% a partir de abril, patamar superior aos 13,75% que indignaram Lula, escandalizaram Stiglitz e ensejaram-no a alertar para os efeitos “mortais” disso para a economia brasileira.
Combater a inflação e o alto custo de vida com uma estratégia de crescimento, ao invés do contracionismo econômico com juros altos legado da gestão do bolsonarista Campos Neto é o desafio central do governo Lula de olho na eleição de 2026.
A professora Isabella Weber, da Universidade de Massachusetts destaca a “percepção de longa data de acadêmicos que estudaram a história da inflação: picos de preços em itens essenciais podem derrubar governos. Quando as pessoas descobrem que, sem culpa própria, os bens sem os quais não conseguem viver de repente se tornam dramaticamente mais caros, elas perdem a confiança no sistema”.
As eleições presidenciais ocorridas em vários países no ano de 2024 mostram governos que perderam e governos que venceram a batalha da inflação e da carestia. O governo Lula precisa recolher daquelas experiências os ensinamentos que levem à sua reeleição em 2026.
Originalmente publicado no Blog do Jeferson Miola
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