Assumir a Presidência de uma Casa Legislativa já é, por si só, uma missão desafiadora, mas comandar a Câmara dos Deputados, uma das instituições mais influentes do país, parece carregar um peso ainda maior. Dos últimos 11 Presidentes da Câmara, a trajetória pós-mandato revela um padrão curioso: metade abandonou a vida pública, três foram presos, e os que permaneceram no jogo político viram suas carreiras sofrerem reveses significativos.
Com a eleição de Hugo Motta para a Presidência da Câmara, o Brasil chega ao seu 113º presidente do cargo, desde o Primeiro Reinado. Mas, diante do histórico recente, o novo presidente deveria se preocupar? Seria esse cargo uma espécie de maldição para quem almeja permanecer por mais de um mandato? O Polêmica Paraíba analisou o destino dos últimos 11 presidentes da Câmara, desde Aécio Neves (2001-2002) até Arthur Lira (2021-2025), e a conclusão pode servir de alerta para quem deseja permanecer tempo demais no comando da Casa.
1. Aécio Neves (2001-2002): O Começo de uma carreira em ascensão e a queda na Lava Jato:
Neto de Tancredo Neves, Aécio começou sua vida pública cedo, conquistando um mandato como deputado federal aos 26 anos. Em 2001, após três mandatos na Câmara, foi eleito presidente da Casa com o apoio de Fernando Henrique Cardoso, derrotando nomes como Inocêncio Oliveira e Aloizio Mercadante.
Optou por não buscar um segundo mandato na Câmara e, em 2002, foi eleito governador de Minas Gerais, onde permaneceu até 2010. Depois, tornou-se senador e disputou a presidência da República em 2014, sendo derrotado por Dilma Rousseff em um segundo turno acirrado.
Sua carreira política sofreu um grande abalo após as investigações da Lava Jato, especialmente após ser flagrado em áudios comprometendo-se a receber R$ 2 milhões de Joesley Batista, dono da JBS. Teve o mandato suspenso e chegou a ser réu no STF. Embora tenha escapado da prisão, sua influência política nunca mais foi a mesma. Hoje, Aécio tenta reconstruir sua trajetória como deputado federal.
2. João Paulo Cunha (2003-2005): Da Presidência à prisão:
Ex-sindicalista e forte nome do PT em São Paulo, João Paulo Cunha foi eleito presidente da Câmara em 2003, com 434 votos, um dos maiores placares da história. Mas, ao final do mandato, sua carreira entrou em declínio após envolvimento no escândalo do mensalão.
O petista foi acusado de envolvimento no esquema ao ser identificado um saque de R$ 50 mil no Banco Rural em nome de sua esposa. Ele escapou da cassação no primeiro momento, mas acabou condenado pelo STF por corrupção passiva, peculato e lavagem de dinheiro, sendo preso em 2013. Cumpriu pena no presídio da Papuda, em Brasília, onde concluiu um curso de Direito. Após a prisão, nunca mais disputou uma eleição.
3. Severino Cavalcanti (2005-2005): O presidente relâmpago que renunciou para não Ser cassado:
A eleição de Severino Cavalcanti foi um dos episódios mais inusitados da história da Câmara. Candidato independente, ninguém acreditava que ele venceria o candidato do governo, Luiz Eduardo Greenhalgh (PT-SP). Mas um racha interno no PT abriu caminho para Severino, que venceu com 300 votos no segundo turno.
O que parecia uma vitória surpreendente tornou-se um pesadelo. Denúncias apontaram que ele cobrava propina de um restaurante na Câmara em um esquema apelidado de “mensalinho”. A pressão foi tanta que Severino renunciou para não ser cassado.
Depois, tentou voltar à Câmara em 2006, mas não conseguiu se eleger. Em 2008, tornou-se prefeito de João Alfredo (PE), mas teve sua reeleição barrada. Morreu em 2020, aos 89 anos.
4. Aldo Rebelo (2005-2007): O último presidente do PCdoB na câmara:
Após a queda de Severino Cavalcanti, foi realizada uma nova eleição, e Aldo Rebelo (PCdoB-SP) saiu vencedor, em um dos pleitos mais disputados da história. Ele venceu José Thomaz Nonô (PFL-AL) no segundo turno por apenas 15 votos.
Rebelo continuou sua trajetória política, ocupando ministérios nos governos Lula e Dilma. No entanto, após disputar uma vaga ao Senado por São Paulo em 2022, teve apenas 1% dos votos e encerrou sua carreira política.
5. Arlindo Chinaglia – 2007 / 2009:
Ex-Presidente da CUT e do Sindicato dos Médicos, Chinaglia foi um dos fundadores do PT. Após um mandato como Deputado Estadual, Arlindo foi eleito para a Câmara Federal pela primeira vez em 1994, naquele que foi o primeiro de oito mandatos consecutivos.
A disputa pela Presidência da Câmara em 2007, evidenciou um racha na base de Lula, pois o Presidente Aldo Rebelo buscava à reeleição, enquanto Chinaglia se colocava como um candidato do PT, que não tinha a Presidência desde a saída de João Paulo Cunha.
A disputa foi muito apertada assim como a de 2005. No primeiro turno Chinaglia liderou a apuração com 236 votos (para vencer em primeiro turno, eram necessários 257) contra 175 de Aldo. Gustavo Fruet (PSDB-PR) somou 98.
Na segunda votação, Rebelo somou apoios da oposição, mas não conseguiu bater o candidato oficial de Lula, que venceu ao receber 261 votos contra 243 de Aldo.
Após o mandato de Presidente, Arlindo se mantém até hoje na Câmara, tendo sido reeleito para o seu oitavo mandato, nas eleições de 2022.
6. Michel Temer (2009-2010): da presidência da Câmara ao planalto – e à prisão:
Michel Temer assumiu a Presidência da Câmara pela segunda vez em 2009, com apoio do PT. Dois anos depois, tornou-se vice-presidente de Dilma Rousseff e, após o impeachment da petista, assumiu o comando do Brasil em 2016.
Entretanto, sua passagem pela Presidência foi marcada por polêmicas, e ele chegou a ser preso em 2019 no âmbito da Lava Jato, acusado de liderar um esquema de propina bilionário. Hoje, está afastado da política.
7. Marco Maia – 2010/2013:
Ex-sindicalista, Marco foi secretário estadual da Administração e Recursos Humanos do Rio Grande do Sul e presidente da Trensurb em Porto Alegre.
Deputado Federal pela primeira vez em 2006, Marco era um dos grandes nomes do PT na época, sendo eleito 1* Vice-Presidente da Câmara na gestão de Michel Temer, sendo alçado ao posto de Presidente em dezembro de 2010, após a renúncia de Temer, que foi eleito Vice-Presidente na chapa de Dilma Rousseff.
Maia buscou a reeleição, sendo eleito em 2 de fevereiro de 2011 com 375 votos. vencendo Sandro Mabel que teve 106 votos, Chico Alencar com 16 votos, e Jair Bolsonaro que teve 9 votos.
Após o mandato concluso em 2013, Maia foi reeleito para um terceiro mandato de Deputado em 2014, naquela que foi sua última passagem como titular pela Câmara.
Maia foi citado na Lava Jato, se tornando réu em 2019. Mas uma decisão do STF de 2021, arquivou as ações contra o ex-Deputado, por entenderem que as denúncias se basearam apenas em delações premiadas, sem provas que corroborassem as irregularidades.
8. Eduardo Cunha (2015-2016): O homem que derrubou Dilma e foi derrubado em seguida:
Se há um exemplo do karma da Presidência da Câmara, ele se chama Eduardo Cunha.
Eleito em 2015 com apoio do Centrão e da oposição a Dilma Rousseff, Cunha se tornou o grande articulador do impeachment da ex-presidente. Porém, em menos de seis meses, ele próprio foi cassado e, em seguida, preso na Lava Jato.
Foi condenado a 15 anos de prisão por corrupção e lavagem de dinheiro. Depois, teve sua pena anulada pelo STF, mas nunca mais conseguiu retornar à política.
9. Rodrigo Maia (2016-2021): três mandatos, mas um fim amargo:
Maia assumiu a presidência da Câmara após a renúncia de Cunha e foi reeleito em 2017 e 2019, algo raro na história. No entanto, ao deixar o cargo, entrou em conflito com o DEM e ficou sem partido.
Sem apoio político, não disputou a reeleição e hoje atua no setor privado.
10. Arthur Lira (2021-2025): O próximo da Lista:
Lira foi eleito com apoio de Bolsonaro e conseguiu se reeleger com apoio de Lula. Com quase 20 partidos ao seu lado, parece ter uma carreira sólida. Mas, se o histórico se repetir, ele pode ser o próximo da lista de ex-presidentes que enfrentam um futuro incerto.
Uma Maldição ou Apenas o Peso do Cargo?
Olhando para os últimos 11 presidentes da Câmara, o padrão é claro: poucos saem ilesos. Seja por envolvimento em escândalos, cassações ou derrotas eleitorais, ocupar o cargo pode ser um fardo perigoso.
Com Hugo Motta assumindo o comando da Casa, fica a dúvida: ele conseguirá escapar desse karma ou será mais um na lista dos amaldiçoados?