A Polícia Federal identificou que dirigentes de entidades envolvidas no esquema bilionário de fraudes no Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) eram beneficiários de programas sociais como o Bolsa Família, o Auxílio Brasil e o Cadastro Único (CadÚnico). A constatação levanta suspeitas de que essas pessoas possam ter sido usadas como laranjas para ocultar os verdadeiros responsáveis pelas associações, segundo aponta o inquérito da PF.
As investigações, conduzidas em Brasília, têm como foco três entidades principais:
- AAPB (Associação dos Aposentados e Pensionistas Brasileiros)
- ABSP/AAPEN (Associação Brasileira dos Servidores Públicos/Associação dos Aposentados e Pensionistas do Nacional)
- Universo (Associação dos Aposentados e Pensionistas dos Regimes Geral e Próprio da Previdência Social)
A PF identificou ao menos cinco presidentes de associações cadastradas em programas voltados a pessoas em situação de vulnerabilidade, sendo quatro delas idosas. São elas:
- Maria Ferreira da Silva, 88 anos, presidente da AAPB desde novembro de 2021. Aposentada desde 2003, consta no CadÚnico com renda familiar per capita de R$ 1.320.
- Maria Liduina Pereira de Oliveira, 56 anos, presidente da AAPB desde fevereiro de 2022. Recebeu Bolsa Família até outubro de 2015.
- Maria Eudenes dos Santos, 65 anos, presidente da ABSP/AAPEN desde novembro de 2022. Recebeu Bolsa Família até julho de 2021 e Auxílio Brasil até fevereiro de 2022. Está inscrita no CadÚnico com renda per capita de R$ 1.320.
- Francisca da Silva de Souza, 71 anos, assumiu a presidência da ABSP/AAPEN em janeiro de 2024. Recebeu Bolsa Família até outubro de 2015.
- Valdira Prado Santana Santos, 79 anos, preside a Universo desde janeiro de 2021. Também está cadastrada no CadÚnico.
Segundo o relatório da PF, além da vulnerabilidade socioeconômica, os perfis dessas dirigentes incluem idade avançada, aposentadoria por incapacidade permanente, baixa renda e ausência de vínculos empregatícios anteriores.
A Polícia Federal afirma que, embora não haja impedimento legal para que pessoas nessas condições ocupem cargos de direção, a gestão de entidades com atuação nacional — que alegam presença em mais de 4 mil municípios — exige articulação e carga de trabalho que poderiam ser incompatíveis com esses perfis.
As investigações indicam ainda que as associações careciam de estrutura para prestar atendimento efetivo aos aposentados e pensionistas. A PF aponta que essas entidades não tinham capacidade para captar associados, realizar filiações ou prestar os serviços prometidos.
O escândalo do INSS
A apuração da PF e da Controladoria-Geral da União (CGU) investiga a aplicação de descontos indevidos nos benefícios de aposentados e pensionistas, sem consentimento dos segurados.
As entidades envolvidas enviavam listas mensais de associados à Dataprev, responsável pelos sistemas do INSS, sem qualquer verificação documental prévia.
Muitos beneficiários não percebiam os descontos por não terem acesso ao portal Meu INSS ou por os valores estarem diluídos entre outros abatimentos, como empréstimos consignados e imposto de renda.
Apesar de denúncias e da existência de milhares de processos judiciais contra essas entidades, os descontos continuaram a ser autorizados.
A CGU identificou casos de aposentados cadastrados em duas associações no mesmo dia, com erros de digitação repetidos nos nomes — indício de uma possível “indústria” de falsificação de autorizações.
Ao todo, 13 entidades foram investigadas e 11 delas viraram alvo da Operação Sem Desconto.