Por Jeferson Miola, publicado em seu blog
Inexistem diferenças substantivas –tanto de forma como de conteúdo– entre os comunicados do Banco Central sob a presidência de Roberto Campos Neto, terminada em 31 de dezembro de 2024, e a de Gabriel Galípolo, iniciada em janeiro deste ano.
Há, ao contrário, uma enorme e preocupante semelhança tanto no diagnóstico do Copom sobre a situação econômica e fiscal do país, como acerca da continuidade da política monetária contracionista.
O comunicado da reunião do Copom de 19 de março presidida por Galípolo apresenta um formato idêntico ao comunicado da última reunião presidida pelo bolsonarista Roberto Campos Neto [11/12/2024], como se observa no quadro comparativo:
Para lembrar: na sua última reunião como presidente, Campos Neto “condenou” a nova gestão “independente” que o sucederia no BC a fazer “ajustes de mesma magnitude nas próximas duas reuniões”, independentemente de qualquer indicação em sentido contrário da realidade, e independentemente da visão do governo aprovado pela soberania popular em 2022.
Mesmo com a maioria de diretores do BC indicados pelo presidente Lula, Galípolo cedeu à fatalidade imposta por Campos Neto e cumpriu a profecia de aumentos de 1% nas duas reuniões que presidiu, elevando a taxa de juros para estratosféricos 14,25% ao ano.
É possível, como alguns avaliam, que Galípolo tenha optado por manter os aumentos comprometidos por Campos Neto por escolha tática, para evitar a reação colérica do rentismo insaciável.
No entanto, essa hipótese fica enfraquecida pela realidade concreta de que desde que passou a liderar a maioria do Copom, Galípolo não fez nenhuma sinalização de transição, ainda que gradual, para outra política monetária.
Assim como em relação à reunião do Copom de janeiro já sob a presidência de Galípolo, o comunicado da reunião de março reforça “as expectativas apuradas pela pesquisa Focus” como parâmetro fundamental para a definição da política monetária.
Importante destacar que a pesquisa Focus, que é uma espécie de “bíblia sindical” do rentismo, tem sua idoneidade e confiança técnica fortemente questionadas.
Ao invés da análise concreta da realidade econômica do país, continua prevalecendo a ode aos tecnocratas das finanças e aos especuladores para definir a taxa de juros: “A percepção dos agentes econômicos sobre o regime fiscal e a sustentabilidade da dívida segue impactando, de forma relevante, os preços de ativos e as expectativas dos agentes”, diz o comunicado.
E prevalece, também, a visão equivocada de arrocho monetário, que considera o crescimento econômico algo maligno. O comunicado explica que “[a] resiliência na atividade econômica e [as] pressões no mercado de trabalho [exigem] uma política monetária mais contracionista”.
O Copom anunciou a continuidade do arrocho monetário, que deverá sangrar o Orçamento da União em 1,6 trilhão de reais em 2025 para o serviço da dívida pública. Diz que na próxima reunião poderá haver “um ajuste de menor magnitude” dos juros, mas ainda assim um aumento, e não o início de uma trajetória de queda, que seria o esperável.
Juros altos para combater esta inflação atual, pós-pandêmica, até pode encher ainda mais os bolsos de rentistas, financistas, parasitas financeiros e dos tecnocratas das finanças, mas será contraproducente para atacar a inflação, especialmente a carestia de alimentos.
A inflação contemporânea, que se manifesta no mundo inteiro, não é uma inflação de procura, como explica o Nobel de Economia Joseph Stiglitz, mas é uma inflação de oferta, de baixa produção e de aumento do poder de barganha empresarial/oligopólica para fixar preços.
Continuar aumentando os juros, portanto, como propõe o Banco Central, não vai aumentar a produção de ovos, de carnes, de café, de milho, feijão, arroz; assim como não vai baixar o preço da cenoura, do tomate e de outros alimentos básicos de consumo das famílias brasileiras.
Neste novo contexto inflacionário, a política monetária deveria ser exatamente oposta à atual. O BC deveria estimular a produção e o consumo, mas faz o contrário, com consequências nefastas para o equilíbrio fiscal, pois aumenta os gastos orçamentários com despesas financeiras e eleva o comprometimento do PIB com a dívida pública.
O ministro Haddad alega que Galípolo “não pode dar um cavalo-de-pau”. O mínimo que se espera, contudo, é que para não ficar refém eterno do mercado, Galípolo emita sinais das mudanças que adotará gradualmente e responsavelmente, mas isso ele não tem feito.
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