Em perfil assinado pelo renomado jornalista e escritor Jon Lee Anderson, a revista New Yorker apresenta um extenso perfil de Alexandre de Moraes, ministro do Supremo Tribunal Federal. Em mais de 70 parágrafos, Anderson percorre a trajetória jurídica de Moraes e sua atuação contra a extrema-direita brasileira.
Anderson inicia o perfil reconstituindo o atentado suicida em que o catarinense Francisco Luiz, de 59 anos, tentou explodir a estátua da Justiça em frente ao STF. O jornalista americano mostra como o atentado de 13 de novembro de 2024 foi o ápice de uma atmosfera política polarizada e “febril”.
Segundo o jornalista da New Yorker, “Bolsonaro se envolveu numa feroz disputa com a Suprema Corte, luta essa personificada contra Alexandre de Moraes”. Quanto mais as investigações avançavam e revelavam as mentiras disseminadas pelas “milícias digitais” do bolsonarismo, mais os investigados acusavam Moraes de ser “tirano e de violar seus direitos”, escreve Anderson.
“Durante a campanha de 2022, Bolsonaro insistiu na falta de segurança das urnas”. Esse foi o estopim para que quatro mil pessoas cercassem a Praça dos Três Poderes e depredassem os prédios do Executivo, Legislativo e Judiciário federais. “Uma estranha repetição do ataque ao Capitólio”, sublinha o jornalista. Bolsonaro negou qualquer envolvimento com tais atos.
Ausente na posse de Lula, Bolsonaro voltou ao país semanas depois e, em junho de 2023, foi condenado por “abuso de poder político” e pelo “uso inadequado da internet” para semear desconfiança no sistema eleitoral — sendo barrado de ocupar cargos políticos por oito anos.
Elon Musk assumiu a causa de Bolsonaro e atacou Moraes de forma reiterada no Twitter, chamando-o de “ditador maligno disfarçado de juiz” e pedindo seu impeachment, recorda Anderson. Em comícios, apoiadores de Bolsonaro agitavam faixas com a imagem de Musk e gritavam: “Obrigado, Elon!”.
Moraes descreveu o ataque suicida de novembro de 2024 como mais uma manifestação da retórica virulenta que domina a internet brasileira. “Cresceu sob o disfarce de uso criminoso da liberdade de expressão para ofender, ameaçar, coagir”, disse. O Brasil vivia uma guerra para determinar a narrativa política. De um lado, Moraes e seus aliados. Do outro, uma coalizão de influenciadores de direita — Bolsonaro, Musk e, cada vez mais, o presidente americano Donald Trump.
O juiz raramente fala com jornalistas, mas conversou com Anderson sobre o que chama de “o novo populismo digital extremista”. Desde o início de 2025, Moraes vinha enfrentando o discurso de ódio nas redes. “Quando Moraes pediu a remoção das mensagens, o X se recusou. Quando impôs multas, elas não foram pagas. Moraes congelou contas bancárias pertencentes ao X e à Starlink, a rede de satélites de Musk. Apesar do pagamento das multas, Moraes sabia que a guerra não havia terminado.”
Para o ministro do STF, “as redes sociais são uma força definidora de nosso tempo. Se Goebbels estivesse vivo e tivesse acesso ao X, estaríamos condenados”, afirmou. “Os nazistas teriam conquistado o mundo.” Segundo ele, “o Brasil era um campo de testes significativo para a disputa política na internet. A extrema direita quer tomar o poder — não dizendo que se opõe à democracia, porque isso não ganharia apoio público, mas alegando que a democracia é manipulada”, diz Moraes. “É um populismo muito bem estruturado e inteligente. Infelizmente, no Brasil e nos EUA, ainda não aprendemos a reagir.”
Big Alex
Os brasileiros costumam se referir a Moraes como Xandão, ou Grande Alex, mas ele não é especialmente alto. É, no entanto, visivelmente em forma: corre, levanta pesos e treina Muay Thai várias vezes por semana. Aos 56 anos, tem a cabeça raspada e um rosto que parece feito para interrogatórios, com uma sobrancelha pesada, maçãs do rosto angulosas e um queixo proeminente. “Ele olha fixamente sem parecer se importar se está sendo rude”, descreve Anderson.
Moraes diz que Musk o descreveu como “uma mistura de Voldemort e um Sith” — ou seja, entre o vilão careca de Harry Potter e um vilão careca de Star Wars. “Ele misturou os dois e disse que sou eu”, contou Moraes, rindo. “Para ser honesto, acho isso divertido.” No entanto, parecia ofendido com a recusa de Musk em obedecer suas ordens: “Como todas as outras empresas, o X deve cumprir a lei brasileira. Naquele momento, Musk se tornou pessoalmente responsável também.”
“Ele frequentemente oscila entre piadas e assertivas legais bruscas.” Crescido numa família de classe média, com pai empresário e mãe professora, cursou Direito na Universidade de São Paulo — escola que formou um terço dos presidentes brasileiros. Ambicioso, pouco depois dos 20 anos já era promotor e havia escrito um manual de direito constitucional. Uma década depois, ocupava cargos importantes em São Paulo: secretário de Transportes da cidade, secretário da Justiça estadual e secretário de Segurança. “Ninguém poderia acusá-lo de ser esquerdista com tal trajetória em governos do PSDB”, continua o jornalista da New Yorker.
Anderson relata como Moraes foi alçado à política nacional. Com o impeachment de Dilma Rousseff e a ascensão de Michel Temer, um hacker ameaçou divulgar fotos da esposa do presidente recém-empossado. A história parecia feita para os tabloides — Temer tinha 75 anos e sua esposa, uma ex-miss, 32. Quando Temer expôs a situação, Moraes rapidamente montou uma equipe de investigadores para rastrear o chantagista e prendê-lo. Em agradecimento, Temer o nomeou ministro da Justiça.
Moraes havia sido ministro da Justiça por menos de um ano quando surgiu uma vaga no Supremo Tribunal Federal, e Temer o indicou para o cargo. “Quando se trata da autoridade do STF, há poucos limites”, diz Felipe Recondo, jornalista brasileiro autor de livros sobre o tribunal. “Eles discutem tudo que é importante, desde impostos até questões raciais e aborto.” Ao contrário dos EUA, muitos casos significativos vão diretamente ao Supremo.
Bolsonaro
Antes de Bolsonaro entrar na eleição presidencial de 2018, poucos observadores políticos o levavam a sério. Após se aposentar do Exército com o posto de capitão, passou décadas na Câmara, onde se destacou pela verborragia. “Uma vez descreveu uma deputada como muito feia para ser estuprada. Em outra ocasião, disse que preferia um filho morto a um filho gay. Sem falar na nostalgia pela ditadura militar que governou o Brasil de 1964 a 1985”, relata Anderson.
Em março, um evento foi organizado na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo para comemorar os quarenta anos da restauração da democracia no Brasil. Havia meia dúzia de palestrantes, quase todas mulheres, incluindo uma historiadora e duas professoras de direito. Enquanto cerca de quinhentas pessoas escutavam, elas relembraram seus próprios esforços juvenis em defesa da democracia e ressaltaram a importância de protegê-la.
Cármen Lúcia Antunes Rocha, única mulher no Supremo Tribunal Federal, vinculou a luta contra a ditadura ao atual embate sobre as redes sociais. “Ser livre é estar sem correntes, ir além das condições de opressão que marcaram nosso passado”, disse. “Em vez de as máquinas estarem sujeitas aos humanos, os humanos estão se tornando sujeitos às máquinas, e isso traz novas formas de tirania. Estamos em risco de sermos acorrentados por algoritmos — por sistemas que sabem muito bem a quem servem.”
O último palestrante foi Marcelo Rubens Paiva, escritor cujo pai foi uma das vítimas do regime. Em 1971, Rubens Paiva, engenheiro civil e político de 41 anos, foi sequestrado em casa, no Rio de Janeiro, e torturado até a morte. Marcelo, um de seus cinco filhos, narrou a história em suas memórias Ainda Estou Aqui, que inspiraram o vencedor do Oscar de Melhor Filme Internacional em 2025.
Os homens que sequestraram Paiva foram indiciados por promotores federais em 2014, mas foram protegidos por uma lei de anistia aprovada no fim do regime, que impediu o país de enfrentar os crimes da ditadura. Ao falar contra a anistia no evento, Marcelo foi aplaudido de pé. “É a lei que minha mãe passou décadas tentando revogar — não por vingança, mas por justiça”, disse. “E até hoje ainda lutamos pela verdade.”
Quando uma estátua foi erguida em homenagem a Paiva, Bolsonaro cuspiu nela — o tipo de provocação que o tornaria uma estrela nas redes. Sua maior vantagem em 2018, além do talento para trollar, foi a ausência de Lula na disputa. Desde o início, havia suspeitas de que a desinformação online favorecia Bolsonaro.
Na eleição de 2018, a internet brasileira estava repleta de mentiras. “Uma análise da Agência Lupa descobriu que apenas quatro das cinquenta imagens mais compartilhadas eram legítimas. Muitas das mentiras mais escandalosas tinham como alvo Fernando Haddad”, escreve Anderson. A mais famosa delas, a da mamadeira de piroca, parecia crível para 84% dos eleitores de Bolsonaro.
O bolsonarismo passou a perseguir quem combatia a desinformação. Entre os alvos principais estava Patrícia Campos Mello, repórter da Folha de S.Paulo. Ela mostrou como empresários financiavam a disseminação de mensagens contra Haddad. Passou a ser ameaçada por bolsonaristas furiosos, e o jornal contratou segurança para protegê-la.
Patrícia foi acusada de seduzir fontes para prejudicar Bolsonaro. “Foi o fim do mundo”, disse. Deputados bolsonaristas a chamaram de prostituta. A pior ofensiva veio de um influenciador chamado Allan dos Santos: “Ele postou conteúdos pornográficos sobre mim, me marcou e convocou seus seguidores a fazer memes”, relatou.
Liberdade de expressão
Moraes observa que a liberdade de expressão no Brasil tem limites: a Constituição, promulgada em 1988 após uma história de golpes e a recente ditadura militar, foi desenhada em parte para “resistir a movimentos antidemocráticos”. Discurso racista é proibido. Também são considerados crimes “contra a ordem democrática” — como espalhar mentiras sobre o sistema eleitoral — e “contra a honra”, como alegar que adversários estupram crianças.
Entre as mensagens difundidas pelo “gabinete do ódio” de Bolsonaro, havia acusações constantes de que o Supremo Tribunal era ilegítimo. Ameaças de morte aos ministros foram ignoradas pela Procuradoria-Geral da República. Diante disso, o Supremo, invocando um estatuto que o autoriza a investigar qualquer “violação da lei criminal nas dependências do Tribunal”, abriu uma investigação própria, com Moraes como relator.
Bolsonaro já estava cercado por escândalos. Seu filho Flávio foi flagrado pagando salários para a esposa e a mãe de um policial ligado à milícia. Havia dúvidas sobre o patrimônio da família Bolsonaro — mais de 50 imóveis. Moraes começou a investigar e, segundo Felipe Recondo, nunca mais parou: “Bolsonaro continuava cometendo crimes, e então Xandão seguia liderando novas investigações”.
Durante a pandemia de Covid-19, Bolsonaro minimizou a gravidade da doença, mesmo com o Brasil entre os países com maior número de mortes. Quando o Ministério da Saúde parou de divulgar os dados diários sobre a pandemia, Moraes ordenou que retomassem a divulgação em até 48 horas. Bolsonaro alegava que as restrições feriam liberdades. “A extrema direita manipulou com sucesso essas palavras para fazer as pessoas acreditarem que são os verdadeiros defensores da democracia”, disse Moraes. “É um feito impressionante de lavagem cerebral.”
O STF não é exatamente progressista. Os ministros hesitaram em avançar na descriminalização do aborto, que segue majoritariamente ilegal no país. Eles julgaram tanto a favor quanto contra Lula em processos envolvendo corrupção e sua elegibilidade. Mas, durante os anos Bolsonaro, os ministros se uniram em torno de Moraes. “O tribunal sempre foi um reflexo da maior parte da sociedade brasileira”, diz Recondo. “O Supremo era formado por onze ilhas. Bolsonaro os uniu.”
TSE
Em junho de 2022, o Judiciário brasileiro elegeu Moraes para presidir o Tribunal Superior Eleitoral, que organiza as eleições no país. Em seu discurso de posse, fez um alerta direto a Bolsonaro: “Liberdade de expressão não é liberdade para destruir a democracia”, afirmou. “Liberdade de expressão não é liberdade para espalhar ódio e preconceito. Liberdade de expressão não permite a disseminação de discurso de ódio nem de ideias contrárias à ordem constitucional.” Bolsonaro sentou afastado dos demais, franzindo o rosto. Quando Moraes elogiou a integridade do sistema eleitoral, recusou-se a aplaudir.
A campanha de Bolsonaro contra as eleições encontrou aliados fora do país. Seu filho Eduardo foi aos Estados Unidos, onde o empresário Mike Lindell, aliado de Trump, o ajudou a montar uma apresentação sobre fraudes no Brasil. Steve Bannon amplificou as acusações. Moraes contou a Anderson que a direita usou táticas semelhantes nos dois países: “Nos EUA, Trump acusou o voto pelo correio de fraude. No Brasil, Bolsonaro atacou as urnas eletrônicas”. Moraes gosta de brincar que, se os brasileiros votassem por sinais de fumaça, a direita diria que o Tribunal Eleitoral desviou a fumaça.
A campanha de Bolsonaro, por incrível que pareça, funcionou. A desinformação nas redes cresceu 16 mil por cento em relação a 2018. Três em cada quatro eleitores de Bolsonaro diziam não confiar no resultado. O TSE aumentou sua atuação contra os ataques online. Juízes emitiram dezenas de decisões, barrando propagandas, desqualificando candidatos que mentiam e impedindo ações da Polícia Rodoviária Federal para dificultar o voto da esquerda.
Na noite da eleição, Moraes foi à TV anunciar a vitória de Lula. Para mostrar unidade, reuniu autoridades de todo o país durante o pronunciamento. “Espero que, a partir desta eleição, parem os ataques ao sistema — os discursos delirantes, as notícias falsas.” Mas milhares de eleitores de Bolsonaro se aglomeraram diante de quartéis do Exército.
Moraes sabia que Bolsonaro não desistiria. “Suspeitávamos que algo pudesse ocorrer na posse — poucos dias antes, houve tentativa de atentado no aeroporto de Brasília.” Quando a cerimônia transcorreu sem incidentes, a segurança relaxou. “Mas uma semana depois aconteceu — o ataque de 8 de janeiro.”
8 de janeiro
Durante os atos, vândalos invadiram o prédio do Supremo, arrombaram um armário com a toga de Moraes e desfilaram com a porta do gabinete como troféu. Moraes sentiu-se pessoalmente ofendido. “Essas pessoas não são civilizadas”, disse em discurso. Nas horas seguintes, expediu mandados de prisão; mais de mil pessoas foram detidas. Para conter autoridades suspeitas de cumplicidade, suspendeu o governador do Distrito Federal e mandou prender o secretário de segurança e o comandante da PM.
Elon Musk, sem ironia, acusou Moraes de ser um autocrata. “Como Alexandre de Moraes se tornou o ditador do Brasil?”, escreveu. “Ele tem Lula na coleira.” Recondo afirma que Moraes se beneficia da simpatia brasileira por figuras fortes, mas acredita que sua cruzada contra a desinformação não é pessoal nem ideológica. “Xandão realmente acredita no que está fazendo, e tem apoio dos colegas no STF.”
Alguns brasileiros argumentam que as redes sociais devem ser reguladas por lei, não por decisões judiciais. “Não acredito que essa discussão deva ocorrer no Supremo”, disse a deputada Tábata Amaral. Com outro deputado, ela passou anos promovendo projetos para responsabilizar as plataformas por fake news e discurso de ódio. Mas sempre enfrentaram lobby das big techs.
De certo modo, o Brasil tem regras mais rígidas que os EUA. “Se for condenado por um crime, você não pode se candidatar”, diz Tábata. “Trump não teria sido reeleito aqui.” Mesmo inelegível, Bolsonaro ainda pode causar estragos. Muitos oponentes chamam Tábata de “Xandão de saias”. Na última eleição, sofreu ataques nas redes; seu adversário a culpou pelo suicídio do próprio pai. “A realidade é que, se Bolsonaro estiver contra você, você está ferrado”, afirmou.
O coautor do projeto da Lei das Fake News, Alessandro Vieira — um ex-bolsonarista que apoiou Lula em 2022 — disse que o foco era responsabilizar plataformas, não usuários. “Não há uma vírgula no texto que criminalize a liberdade de expressão.” Mas considerou impossível aprová-lo. “A legislação da internet no Brasil foi feita numa era romântica, quando ainda se via a rede como neutra e democrática”, disse. “Hoje, a maioria do Congresso tem medo das big techs. Imagine concorrer com o algoritmo contra você!”
Democracia
Após o ataque de 8 de janeiro, Bolsonaro ridicularizou a tese de golpe. Disse que os manifestantes eram apenas “vovozinhas com bandeiras e Bíblias”. Mas a Polícia Federal descobriu documentos de aliados que montavam planos para mantê-lo no poder à força.
Para Moraes, ainda há risco à democracia brasileira. Oficiais das Forças Armadas e altos comandantes da PM estavam envolvidos — agora todos respondem a processos. “A estratégia era ocupar os prédios — não necessariamente destruí-los”, afirmou. “Mas você não controla uma multidão. O plano era entrar, não sair, e provocar uma crise tão grande que o Exército fosse forçado a agir. A ideia era pedir apoio militar para um golpe. Mas o plano falhou.”
Ao ser perguntado se Bolsonaro havia planejado a insurreição, Moraes desviou: “Como posso ter que julgar esse caso, não posso comentar.” Semanas depois, um relatório de 884 páginas revelou Bolsonaro como participante direto de um complô. O objetivo não era só derrubar o governo: havia plano para matar Lula e seu vice, e “neutralizar” Moraes.
Os conspiradores se coordenavam por um grupo no Signal chamado Copa do Mundo 2022, com cada um assumindo o nome de uma seleção. Monitoraram Moraes por semanas. Em 15 de dezembro de 2022, ao retornar a Brasília, um grupo armado cercou sua casa, planejando sequestrá-lo ou matá-lo, destruir os celulares e fugir. No último minuto, uma mensagem cancelou o ataque.
No dia anterior, uma proposta para anular a eleição e decretar estado de sítio circulou entre líderes militares, mas vários se recusaram a assinar. Moraes sugeriu que foi salvo por contatos que mantinha nas Forças Armadas desde o tempo de ministro da Justiça. “Brinco com minha equipe que eu não podia morrer”, disse.
Bolsonaro e seus aliados esperam ajuda de Trump. O presidente americano pouco falou sobre o Brasil, mas parece partilhar da irritação de Bolsonaro com a censura nas redes. Em 20 de janeiro, a Casa Branca divulgou nota acusando o governo Biden de “pisotear a liberdade de expressão… sob o pretexto de combater ‘desinformação’, ‘mentiras’ e ‘maldade’”.
Em 19 de fevereiro, a Trump Media processou Moraes nos EUA, alegando censura por ele ordenar que a Rumble tirasse do ar a conta de Allan dos Santos. Moraes classificou o processo como “completamente sem fundamento”: “Assim como eu não posso mandar algo nos EUA, nenhum juiz de lá pode invalidar uma ordem minha no Brasil.”
Naquele mês, o deputado da Geórgia Rich McCormick divulgou nota alinhando Bolsonaro a Trump e Musk. “A acusação contra Bolsonaro não é justiça — é guerra judicial para eliminar adversários.” “Os EUA não podem deixar juízes estrangeiros decidirem o que os americanos podem dizer, ler ou publicar”, afirmou.
Eduardo Bolsonaro assistiu à vitória de Trump na casa do ex-presidente, na Flórida, e tem trabalhado para que ele intervenha. Já conta com Musk, que afirma que Bolsonaro sofre uma das piores censuras do mundo, “nas mãos de um criminoso do pior tipo”. Em posts, Musk declarou que “a esquerda perderá as próximas eleições no Brasil”.
Em março de 2025, Moraes afirmou: “Agora, cada um vai responder nos tribunais, onde poderá se defender. Mas toda essa narrativa de perseguição política caiu por terra — porque não foi só a Polícia Federal que acusou. O próprio procurador-geral apresentou as denúncias.”
Moraes não vê chance de Bolsonaro concorrer em 2026. “É possível que ele seja absolvido criminalmente — o julgamento está no início. Mas ele tem duas condenações por inelegibilidade. Não há possibilidade de retorno. Ambos os casos já foram apelados e agora estão no Supremo. Só o Supremo poderia reverter — e não vejo a menor chance de isso ocorrer.”
Regulação
Nos próximos meses, o STF decidirá sobre a regulamentação da internet. Hoje, plataformas só são responsabilizadas se descumprirem ordens judiciais. O tribunal analisará se elas podem ser responsabilizadas antes disso — obrigando as empresas a monitorar os próprios usuários.
Para Moraes, a regulação é uma forma de recuperar o controle. “As redes sociais são o maior poder hoje”, afirmou. “Elas influenciam pessoas, dominam a publicidade global e têm poder de interferir em eleições.” Comparou as big techs à Companhia das Índias Orientais, que dominava países onde atuava. “Elas não querem obedecer nenhuma jurisdição. Querem imunidade total.”
As ações duras de Moraes inflamaram bolsonaristas. Tornou-se comum ouvir que a liberdade de expressão morreu e que o Supremo tem poder ditatorial. Oliver Stuenkel, cientista político em São Paulo, apoia as medidas do tribunal, mas aponta um risco: “O Brasil virou exemplo de como proteger a democracia, mas não é saudável que o STF seja ator político permanente.”
Moraes, no entanto, não considera a crise encerrada. “Acho que as ações recentes de Trump vão fazer os governos entenderem que, se não agirem agora para controlar as redes sociais, será tarde demais.” Líderes europeus já estudam regras mais duras. Em agosto, autoridades francesas prenderam o fundador do Telegram por permitir atividades criminosas — de tráfico a terrorismo — em sua plataforma.
Conheça as redes sociais do DCM:
⚪Facebook: https://www.facebook.com/diariodocentrodomundo
🟣Threads: https://www.threads.net/@dcm_on_line