
Bernardinho durante imersão com gestores realizada em São Paulo pela HSM. Foto: Colagem de Thais Barroco sobre fotos de HSM
As redes sociais são hoje o principal fator de desequilíbrio emocional entre atletas, afirma Bernardinho, técnico da seleção brasileira masculina de vôlei. Campeão olímpico, ele diz que a pressão online pode ser mais devastadora do que as derrotas em quadra. “Você fica arrasado. Não quer mais jogar. Quer abandonar a carreira”, descreve.
Para ele, se as redes já tivessem a força atual em 2004, a geração dourada do vôlei brasileiro talvez não tivesse resistido. “Em 2003, vencemos uma competição incrível na Espanha. Depois, perdemos a semifinal do Pan-Americano e vieram as críticas. Se já houvesse mídias sociais naquele momento, não sei se teríamos ganhado.”

O primeiro ouro olímpico de Bernardinho foi em 2004, em Atenas. Foto: Jonne Roriz/Estadão
Bernardinho ressalta que as redes também interferem no mundo corporativo – onde ele realiza palestras e cursos sobre gestão de pessoas a partir dos exemplos e vivências que teve no esporte, como a imersão que ele irá realizar em julho, outubro e novembro em São Paulo pela HSM.
O treinador aponta que a lógica acelerada das redes cria a ilusão de que tudo pode ser conquistado com facilidade e rapidez. “A velocidade com que se tem acesso às coisas fez as pessoas acreditarem que podem ter tudo muito rapidamente.” Segundo ele, esse é um desafio dos gestores para liderar grupos mais jovens.
GERAÇÃO Z

Bernardinho (direita) na década de 1980 como jogador da seleção brasileira de vôlei. Foto: Acervo/Estadão
Para Bernardinho, a falta de resiliência dos jovens tem origem na educação familiar. “O estagiário chega em casa e reclama porque o chefe deu bronca. Aí os pais vão falar com o chefe. Opa? Peraí! A vida não vai ser sempre justa. Os ‘nãos’ fazem parte do processo.”
O treinador analisa a dificuldade também de gestores se posicionarem: “Muitas vezes, os líderes, em vez de dizerem o que é necessário, se escondem na conveniência. ‘Poxa, eu não quero ser duro.’ Mas, ao deixar de dizer o ‘não’ que era necessário, o que acontece? O profissional não desenvolve justamente a sua resiliência.”
Para Bernardinho, a única forma de desenvolver força emocional é enfrentando os “nãos” que fazem parte do caminho. “Se não passar por isso, o jovem sai de uma empresa que exige dele para buscar outra onde a cobrança é menor. A pergunta que eu coloco é: ele vai crescer nesse ambiente mais confortável?”

Da esquerda para a direita, Bruninho, Murilo Endres, Bernardinho e Sidão durante jogo da seleção masculina de vôlei em 2012. Foto: Andre Lessa/AE
Como exemplo de maturidade emocional, Bernardinho cita o tenista João Fonseca, de 18 anos. “Ele perdeu no Rio Open e disseram que era cansaço. Mas ele teve a humildade de dizer que não estava cansado – e que perdeu porque não soube lidar mentalmente com a situação. Isso demonstra a grandeza do atleta.”
COBRANÇA
Apesar de ter treinado vários medalhistas ao longo da vida profissional, Bernardinho diz que não existe uma fórmula para o sucesso. “A forma e o nível de cobrança da geração do Giba é diferente daquela usada com a geração do Lucarelli. E não estou comparando capacidade. São dois grandes jogadores, de gerações diferentes.”

A segunda vitória de Bernardinho nas Olimpíadas foi em 2016, no Rio. Foto: Marcio Fernandes/Estadão
Ele afirma ser necessário conhecer o profissional, se conectar, entender como ele reage a desafios e como é a autoestima dele no ambiente de trabalho. Acima de tudo, o treinador destaca que é imprescindível compor uma equipe com valores alinhados. “Se acreditamos nos mesmos valores – por exemplo, que um ambiente de alto desempenho (como a seleção de vôlei) requer um nível de cobrança elevado, e que meu líder está exigindo de mim porque acredita no meu potencial – o ambiente não se torna tóxico. Pode ser cansativo em certos momentos. Mas quem disse que não vai ser? Você vai ter que virar à noite às vezes. Mas você faz acreditando num propósito.”
O problema, diz ele, é quando o clima corporativo fere esses valores. “O líder cobra muito, mas não respeita os funcionários; exige muito sem entender o limite do profissional”, destaca Bernardinho.
No fim, o técnico resume sua filosofia em duas palavras: humildade e responsabilidade. “Sempre vai ter alguém melhor que você. Aprenda. O líder tem responsabilidade. O profissional errou? Quem escalou ele fui eu. Todo mundo falha. Eu também.”

Antes de treinar a equipe masculina, Bernardinho comandou a seleção feminina. Na foto, a comemoração do bronze em Sydney, em 2000. Foto: COB/Divulgação