Um ano após o fiasco do 1º de Maio e a reprimenda pública de Lula (PT), o ministro Márcio Macêdo ainda não conseguiu sair da linha de tiro. À frente da Secretaria-Geral da Presidência, pasta responsável pela articulação com os movimentos sociais, ele acumula críticas pela falta de diálogo com as principais entidades do País e vê a pressão por sua demissão crescer.
No Planalto e no PT, a fritura de Márcio Macêdo já é aberta e quase unânime. Ele virou até alvo de piadas internas — como o apelido de “alma penada”, usado por colegas ao se referirem a ele. Ainda assim, Macêdo tem resistido. A assessoria do ministro nega essas versões e também a possibilidade de que o presidente esteja contrariado com o auxiliar. As críticas ao evento do ano passado, também segundo esse assessor, foram palavras mal interpretadas.

Ministro da Secretaria-Geral da Presidência da República, Márcio Macêdo ao lado de Lula Foto: Bruno Peres/ASCOM SG-PR
Neste ano, Lula decidiu não participar de atos públicos, como já fez em outras ocasiões, e fará apenas um pronunciamento em cadeia nacional no dia 1º de maio. Nesta terça-feira, 29, em sinal de afago, o presidente recebeu no Palácio do Planalto líderes das principais centrais sindicais, acompanhado de Márcio Macêdo e do ministro do Trabalho, Luiz Marinho. As centrais apresentaram suas reivindicações, como a redução da jornada de trabalho e o fim da escala 6×1. As conversas para que o encontro acontecesse foram costuradas exclusivamente por Marinho.
“Nós precisamos dessas mobilizações e tantas outras. A sociedade brasileira exige distribuição de renda, exige crescimento da economia, exige continuar gerando empregos. Estamos com a menor taxa de desemprego da nossa história, mas é preciso continuar crescendo, gerando empregos e gerando renda, sobretudo, subindo renda”, disse o ministro. Ele e representantes da Central Única dos Trabalhadores (CUT) argumentam que um presidente aberto ao diálogo com os movimentos sociais e sindicais tem que ser elogiado.
“A isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil foi a proposta dos trabalhadores que o presidente Lula encampou, assim como a luta pela valorização do salário mínimo, pela valorização do serviço público, a luta pela diminuição da jornada de trabalho. Nós estamos do mesmo lado da história e na defesa dos trabalhadores e do povo brasileiro”, completou Macêdo, recorrendo aos slogans criados pelo ministro da Secretaria de Comunicação Social (Secom).

Em 2024, ato com Lula em Itaquera recebeu pouco público e presidente reclamou no palco Foto: Taba Benedicto/Estadão
Assessores do presidente atribuem a permanência de Macêdo no cargo também ao fato de que a reforma ministerial está parada. E o posto do secretário é extremamente cobiçado, o que renderia a Lula mais um problema para administrar entre os partidos aliados. Há também a questão de que o ministro é muito próximo do presidente e, para demiti-lo, teria que haver algum lugar em que ele não se sentisse largado no ostracismo.
Há exatamente um ano, Márcio Macêdo se tornou alvo de críticas públicas do presidente Lula após o fracasso do ato das centrais sindicais no Dia do Trabalho. Ao chegar ao evento, Lula se deparou com uma plateia vazia, com menos de duas mil pessoas, segundo a estimativa do Monitor do Debate Político da Universidade de São Paulo (USP). Durante seu discurso, o presidente não economizou palavras: chamou o evento de “mal convocado” e disse que tratou diretamente do assunto com Macêdo.
Rud Rafael, dirigente do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) e integrante da Frente Povo Sem Medo, defende que o governo federal aprofunde e torne mais frequente o diálogo com os movimentos sociais. “Esse diálogo precisa ir além dos espaços institucionais, como os conselhos. No ano passado, fizemos reuniões das frentes e do fórum das centrais, e ficou claro que essa interlocução precisa ser contínua. Estava prevista uma reunião com o presidente Lula antes do fim do ano, mas ela não aconteceu”, afirma.
O dirigente cita episódios que desgastaram a relação com o Planalto, como a organização do G20 Social. “O formato proposto pelo governo não satisfez o movimento, porque limitou a autonomia e a diversidade no processo de construção e acabou refletindo problemas de logística e estrutura significativos. A coordenação deveria ser mais ampla e a definição das atividades acabou aquém das expectativas, com horários estreitos e propostas de atividades não aceitas. Esse balanço já foi feito com o governo e existem indicativos que será diferente no contexto da COP 30”, explica Rud.
Outro ponto alvo de crítica foi o anúncio da proposta de ampliação da isenção do Imposto de Renda, feito em evento fechado. “É uma pauta que está em nosso plebiscito popular, que as frentes e centrais estão levantando. Há momentos e pautas específicas que poderíamos ter um diálogo melhor e uma construção conjunta, mas isso não tem acontecido”, diz Rud, que também critica a falta de mobilização oficial em torno da pauta da anistia. “O governo não tem apostado na mobilização. Sabemos que a conjuntura está difícil, mas seguimos acreditando que esse é o único caminho.”
A presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE), Manuella Mirella, diz que Márcio Macêdo sempre manteve canais abertos com a entidade e com os movimentos sociais. Mas afirma que isso, por si só, não é suficiente. “Nosso papel enquanto entidade representativa da juventude é justamente cobrar cada vez mais espaços de escuta, mais diálogo permanente e mais respostas concretas para avanços na educação e no Brasil”, afirma.
Ela aponta insatisfação da entidade com a falta de respostas do governo federal em relação a pautas consideradas urgentes pelo movimento estudantil, como a recomposição do orçamento das instituições federais de ensino superior e a publicação do marco regulatório do ensino a distância.
“A ideia é fazer neste ano algo muito mais festivo do que um ato com reivindicações”, relatou João Paulo Rodrigues, dirigente do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Ele disse que o setor ainda não se sente atendido como avalia acontecer com grandes produtores rurais. Mas observa que, na medida do possível, o presidente tem ouvido o MST e já esteve com eles neste ano.
Um assessor muito próximo do presidente lembra que a relação das pessoas com o trabalho mudou muito desde as décadas em que surgiram os movimentos sociais. As pautas ficaram setorizadas e a direita tem conseguido o monopólio das categorias, principalmente, por meio das redes sociais. Mesmo assim, ele crê que o governo tem conseguido por meio dos ministérios manter a mobilização dos conselhos que haviam sido todos dispensados pelo ex-presidente Jair Bolsonaro.
Diante da insatisfação com a atuação de Márcio Macêdo, aliados de Lula têm buscado alternativas para fortalecer o diálogo com a sociedade civil e os movimentos sociais. A principal frente dessa movimentação tem sido o Prerrogativas, coletivo de juristas alinhado ao PT e liderado pelo advogado e militante petista Marco Aurélio de Carvalho — que, no passado, chegou a ser cogitado para o cargo hoje ocupado por Macêdo.