BRASÍLIA — Os valores repassados pelo governo federal ao Sindicato Nacional dos Aposentados, Pensionistas e Idosos (Sindnapi) – que tem o irmão do presidente Lula (PT), Frei Chico, como vice-presidente – cresceram 564% de 2020 para 2024, a partir dos descontos nas mensalidades de aposentados e pensionistas do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).
O sindicato é uma das entidades investigadas por fraudes na Operação Sem Desconto, deflagrada na semana passada. Diferentes investigações na Polícia Federal, na Controladoria-Geral da União (CGU) e no Tribunal de Contas da União (TCU) apontaram que a maior parte das mensalidades descontadas a associações e sindicatos não foi autorizada pelos beneficiários.

José Ferreira da Silva, mais conhecido como Frei Chico, é vice-presidente do Sindicato Nacional dos Aposentados, Pensionistas e Idosos (Sindnapi). Foto: Monalisa Lins/Estadão
O dinheiro transferido pelo governo ao Sindnapi a partir das mensalidades somou R$ 23,3 milhões em 2020 e atingiu R$ 154,7 milhões no ano passado, de acordo com dados do Portal da Transparência.
Procurado, o Sindinapi afirmou que o aumento dos valores de repasses tem relação direta com o aumento do número de sócios do sindicato, que teve seu maior crescimento durante a pandemia. Além disso, a entidade afirma que o “período proporcional de maior crescimento” se deu de 2020 a 2022, quando o presidente era Jair Bolsonaro (PL), apesar de os repasses terem crescido no governo atual.
“Qualquer ilação de que o aumento de repasses tem relação com Frei Chico é absurda e não se confirma, já que ele não poderia ter feito o Sindnapi ter mais sucesso exatamente nos anos de Bolsonaro na presidência, quando, aliás, denunciamos o que estava acontecendo no INSS no Conselho Nacional da Previdência conforme várias matérias já comprovaram”, disse o sindicato.
O INSS reforçou a nota divulgada na semana passada em conjunto com o Ministério da Previdência Social, alegando que o governo agiu para melhorar o controle e prevenir as fraudes, mas não fez comentários específicos sobre o sindicado dirigido pelo irmão do presidente da República.
Nesta segunda-feira, 28, o Partido Novo acionou o Tribunal de Contas da União (TCU) para suspender os repasses públicos ao Sindinapi, cobrar a devolução dos valores descontados ilegalmente e responsabilizar os gestores e dirigentes envolvidos. Na última quinta-feira, o governo anunciou a suspensão dos descontos de todas as associações e sindicatos.
Segundo as investigações, a fraude no INSS ocorreu com as mensalidades cobradas por sindicatos e associações de aposentados e descontadas diretamente na folha de pagamento dos beneficiários. Os descontos dispararam em 2023, no governo atual, e a maior parte não foi autorizada pelas pessoas atingidas pelos valores debitados. A Polícia Federal suspeita de um esquema que envolvia o pagamento de vantagens indevidas para dirigentes do INSS.
O Sindnapi é ligado à Força Sindical e oferece consultas médicas, dentista, academias e serviços de lazer para os aposentados. O número de associados aumentou de 237,7 mil em 2021 para 366,2 mil em 2023, de acordo com auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU).
Como consequência, os repasses também aumentaram: de R$ 37,7 milhões em 2021 para R$ 64,5 milhões em 2023. Os dados do Portal da Transparência revelam que os pagamentos totalizaram 154,7 milhões em 2024.
Em uma amostra de 26 mensalidades cobradas pelo Sindinapi, a CGU constatou no ano passado que 20 delas (76,9%) não foram autorizadas. Dados do INSS, por sua vez, mostram que as cobranças do sindicato ligado a Frei Chico excluídas das folhas de pagamento, a pedido dos beneficiários ou por ato próprio do órgão, aumentaram de 3.866 em 2022 para 28.039 em 2023 – atingindo o pico de 36.502 no ano passado.
O INSS não distinguiu o que foi autorizado ou não autorizado de cada associação, mas atestou, no total de entidades, que 96% das mensalidades de 2024 foram cobradas indevidamente.
José Ferreira da Silva, mais conhecido como Frei Chico, é vice-presidente do sindicato. Na quarta-feira, 23, em entrevista ao Estadão, ele negou irregularidades e defendeu uma investigação dos atos. “Eu espero que a Polícia Federal investigue de fato toda a sacanagem que tem. Agora, o nosso sindicato, eu tenho que certeza que nós não temos nada, não devemos m* nenhuma”, afirmou o sindicalista. Procurado novamente nesta terça-feira, 29, não comentou.
Parlamentares cobram explicações do governo e pressionam por CPI no Congresso
O caso mobilizou parlamentares da oposição a cobrar explicações do governo. Deputados do Partido Novo protocolaram um projeto para derrubar uma norma assinada pelo então presidente do INSS, Alessandro Stefanutto, em março de 2024, que eximiu o órgão de responsabilidade sobre os descontos indevidos. Stefanutto foi afastado do cargo após a operação da Polícia Federal e pediu demissão depois que o próprio presidente Lula ordenou sua saída.
“São fraudes bilionárias, prejuízo para quem mais precisa e proteção para os aliados do poder. O que acontece hoje no INSS é a repetição do velho roteiro de corrupção dos governos do PT“, afirmou o deputado Marcel van Hattem (RS), representante do Novo na Câmara.
No Senado, a bancada busca assinaturas para a instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), porém, não há apoios suficientes no momento. O governo tem uma base mais consolidada entre os senadores na comparação com os deputados. “Precisamos apurar os fatos para que os responsáveis sejam punidos e os brasileiros lesados sejam devidamente ressarcidos”, disse o senador Eduardo Girão (Novo-CE).