
Daniel StielerPresidente do Conselho de Administração da Vale
RIO − Reconduzido para seu terceiro mandato como conselheiro da Vale e o segundo como presidente do Conselho de Administração da mineradora, Daniel Stieler acredita que a gigante brasileira está pronta para navegar em qualquer cenário, inclusive o atual, de incerteza global deflagrada pelo tarifaço de Donald Trump. De olho nos clientes asiáticos, a companhia está desenvolvendo um novo produto, de menor teor de ferro, voltado principalmente à demanda das siderúrgicas asiáticas, com lançamento previsto até julho.
Stieler, que recebeu o Estadão/Broadcast na sede da Vale, no Rio de Janeiro, afirma que a companhia voltará a ser uma das melhores do mundo em performance, preferindo destacar os múltiplos à referência do valor de mercado. “Não há por que a Vale não ter múltiplos financeiros iguais aos de nossos principais concorrentes.” Leia abaixo os principais trechos da entrevista:
Como a Vale está enfrentando a instabilidade global deflagrada pelo tarifaço iniciado pelos EUA?
Acreditamos que essas décadas de trabalho ajudaram a construir bastante resiliência para navegar em qualquer tipo de cenário. As geografias onde a gente atua, principalmente no Brasil, em Carajás (no Pará), são as melhores reservas mundiais de minério de ferro − que é o carro-chefe da companhia. Estamos também investindo muito no cobre porque acreditamos. Não há por que a Vale não ter múltiplos financeiros iguais aos de nossos principais concorrentes.
Mas como a empresa está se movimentando?
Queremos estreitar bastante a relação com clientes, principalmente da Ásia. É importante que essas relações comerciais sejam fortalecidas. E se tivermos a oportunidade de construir boas soluções em cima de produtos que temos, de ferro ou de pelota, ou de briquete, nós, do Conselho, apoiaremos. O ponto é estreitar a relação com os clientes, ter uma estratégia comercial usando as vantagens competitivas que temos: megahubs, um portfólio superior, entregar um minério de ferro de qualidade flexível.
E o novo produto, de menor teor de ferro, que a Vale deve lançar até julho?
Temos que focar em soluções que atendam as expectativas dos nossos clientes, ouvir os clientes. Quando trouxemos o Rogério Nogueira (vice-presidente Executivo Comercial e Desenvolvimento), foi no sentido de desenhar uma estratégia comercial que conseguisse identificar uma vantagem competitiva que temos com um minério de ferro de alta qualidade. As composições do nosso minério também me proporcionam isso. A Vale, pela qualidade de seu produto, consegue ter bastante resiliência em qualquer cenário, mas queremos estreitar bastante a relação com os nossos clientes, principalmente da Ásia.

“Não há por que a Vale não ter múltiplos financeiros iguais aos de nossos principais concorrentes”, afirmou Stieler Foto: Fabio Motta/Estadão
A companhia voltará a ser uma das maiores do mundo?
Sim. Endereçamos bem os principais “overhangs” (incertezas). Queremos voltar a estar entre as melhores companhias em termos de performance. Temos boas reservas, somos uma empresa quase secular. Ser a maior do mundo ainda não é uma ambição declarada. Mas queremos buscar um valor mais perto dos múltiplos dos nossos principais concorrentes. E temos a nossa estratégia. Isso está no mandato dos nossos administradores. Precisamos estar mais perto em termos de reconhecimento de valor em função das entregas.
Qual é a jornada da Vale nesse sentido?
A disciplina na gestão de capital hoje é bastante importante. É o que temos discutido com bastante profundidade. A questão de gestão de projetos, gestão de custo e estabilidade de produção − com segurança e inovação − são os direcionadores mais importantes que temos na nossa estratégia. Em paralelo a isso tem todo esse processo de discussão que queremos.
Qual discussão?
São três pilares. Você tem uma companhia orientada para resultados. Tem o processo de inovação, ser referência em segurança, ter excelência operacional, a simplificação de processos e o nível de automação ou de inovação responsável. Precisamos ser ágeis, manter a competitividade, e investir nos talentos na companhia. E cada vez mais a gente entende a questão de construir um relacionamento confiável e ter parceiros confiáveis.
Que parceiros são esses?
Queremos que o meio onde a gente atua tenha confiança na companhia. Isso é uma questão reputacional. Queremos ser reconhecidos como uma empresa que agrega valor. Precisamos que as comunidades entendam que onde atuamos, levamos desenvolvimento econômico; e que promovemos inclusão social, programas de proteção na questão ambiental, nas questões de reparação.
As relações com o governo já trouxeram tensão à companhia durante o processo de sucessão do presidente. Como estão agora?
Queríamos aprimorar e aproximar os vários stakeholders da companhia. O poder concedente é um deles. Mais as comunidades, os funcionários, os parceiros e fornecedores.
Mas por parte do governo, há boa vontade?
Há uma boa vontade das partes (governo e Vale). A pauta é bastante positiva dos dois lados − a Vale agregando aqui para o seu negócio, o governo entendendo o quanto a Vale pode trazer de benefício para a sociedade. É isso que queremos. Queremos ser reconhecidos, ser um parceiro confiável. Precisamos dessas articulações. E o governo quer trazer valor para a sociedade.
Como está a Vale por dentro, após a escolha de Gustavo Pimenta para presidente e a pacificação do Conselho, que sofreu um racha durante o processo de sucessão do CEO?
A cada dia que passa a gente percebe o quanto foi importante esta decisão de escolher Pimenta. Ele é bastante preparado, tem debatido bastante com o Conselho todas as estratégias de atuação, de comunicação, de compromissos. Debatemos com bastante profundidade a questão de Mariana, a questão da renovação da concessão das ferrovias, um diálogo bem responsável. Então, as decisões foram tomadas de propostas construídas entre os dois colegiados (Conselho de Administração e Comitê Executivo, formado pelo presidente e sete vice-presidentes).
Nos EUA e no Brasil, o ânimo de compromissos sócio-ambientais arrefeceu na onda conservadora. Como a Vale vai se posicionar?
A Vale não revisou nenhum compromisso. O movimento de sustentabilidade vai persistir e a gente precisa ser protagonista, até pela envergadura que a Vale tem. Então, nós acreditamos, somos fiel a ela. E acreditamos que isso agrega valor para a companhia. Claro que sempre avaliamos os tempos e movimentos. Precisamos engajar parceiros e clientes importantes, mas acreditamos na questão social, na ambiental, no mundo mais descarbonizado.