A juíza Ana Christina Soares Penazzi Coelho, da 3ª Vara Criminal de João Pessoa, fez um apelo à presidência do Tribunal de Justiça da Paraíba (TJPB), nesta segunda-feira (12), em busca de medidas contra a série de suspeições que têm afetado os processos da Operação Calvário. A operação investiga a suspeita de desvio de recursos públicos durante o governo de Ricardo Coutinho (PT).
Em um documento, a magistrada relatou que um dos casos da operação foi redistribuído para o seu gabinete após o juiz responsável se declarar suspeito por motivo de foro íntimo. De acordo com a juíza, isso tem ocorrido repetidamente, com juízes que se declaram suspeitos por questões pessoais, impactando diretamente a continuidade dos processos e gerando um problema de sobrecarga na 3ª Vara Criminal.
Ana Christina destacou que o processo de impedimento tem sido cada vez mais frequente, especialmente em casos envolvendo organizações criminosas, que são de alta complexidade e envolvem múltiplos réus. Ela ressaltou que, embora a prática de declarar suspeição seja prevista para garantir imparcialidade, a quantidade de suspeições nos casos da Operação Calvário pode estar configurando um abuso deste direito, prejudicando o princípio do juiz natural.
A juíza também alertou que a 3ª Vara Criminal, embora de competência natural para julgar crimes comuns, tem se tornado, na prática, a vara especializada em processos de criminalidade organizada, sem que haja uma estrutura adequada para lidar com essa demanda crescente. Ela ainda ressaltou que o acúmulo desses processos pode resultar em prejuízos irreparáveis, como o atraso na apuração dos crimes e o risco de prescrições indevidas.
Diante da situação, Ana Christina determinou o envio de um ofício ao TJPB, com a listagem provisória dos processos que chegaram à sua vara devido às suspeições, solicitando que o tribunal tome as providências necessárias para corrigir essa anomalia e minimizar os danos já causados. Ela também solicitou que o problema seja resolvido em até 30 dias, a fim de garantir a regularidade dos procedimentos judiciais. As informações são do Blog do Wallison Bezerra
Veja o documento na íntegra:
Analisando os autos, observo que o presente processo aportou neste juízo, em razão da suspeição, por motivo de foro íntimo, do magistrado titular do Juízo de origem, gerando consecutivas suspeições, também de foro íntimo, dos magistrados que figuram na tabela de substituição automática, conforme resolução n.37/2024 do E.TJPB.
Observo, ainda, que esta prática tem se tornado frequente nos processos que envolvem criminalidade organizada, cujos feitos são de alta complexidade, envolvendo múltiplos crimes e réus, gerando o recebimento, por esta magistrada, de inúmeros feitos desta natureza, o que vem inviabilizando o seu regular trabalho perante os processos de sua jurisdição natural.
É cediço que, ao magistrado, é garantido o direito de averbação de suspeição, por motivo de foro íntimo, quando entender que a sua atuação no feito, compromete a imparcialidade necessária para julgamento e para a boa prestação jurisdicional. Contudo, o que tem se observado, com as inúmeras averbações de suspeições subsequentes, por diversos magistrados, esgotando, inclusive, a tabela de substituição imediata, é que está havendo, em tese, um abuso do direito de suspeição, comprometendo o princípio do juiz natural e, mais grave, uma seletividade indevida para atuação nos feitos.
Os processos recebidos são todos de alta complexidade e tem tonado a 3ª Vara Criminal da Capital, na prática, uma vara privativa do crime organizado, sem que haja uma competência legal para tanto ou mesmo uma estrutura necessária que garanta a eficiência na prestação jurisdicional.
Por outro lado, verifica-se que esta prática tem comprometido o regular tramite desses processos, tornando os feitos demasiadamente antigos e prejudicando a apuração regular dos crimes, o que pode viabilizar prescrições criminais indevidas e comprometimento da memória, com relação às testemunhas. Isso porque, tais suspeições já haviam ocorrido anteriormente, tendo o Tribunal de Justiça da Paraíba, na gestão anterior, solucionado a questão, com a designação de um juiz para atuar nos feitos oriundos das referidas suspeições.
Ocorre que, com a chegada dos novos titulares das varas criminais e a recente remoção da magistrada anteriormente designada, o problema tornou-se novamente recorrente, surgindo uma demanda insustentável na 3ª Vara Criminal, que possui acervo próprio de distribuição, inclusive, de organizações criminosas.
Assim sendo, encaminhe-se oficio à presidência, incluindo a listagem provisória de processos que já aportaram nesta vara em razão das suspeições, para que possa ter ciência e tomar as providências cabíveis para a melhor solução desta anômala situação, sanando os prejuízos já relatados anteriormente. Instrua-se o ofício com cópia deste despacho.
Tendo em vista o comprometimento do princípio do juiz natural, aguarde-se a resolução da questão, perante o Tribunal de Justiça da Paraíba, pelo prazo de 30 (trinta) dias.
Redação