Neste caso, prefiro confiar nos meus sentimentos mais do que na minha memória. A única coisa de que tenho certeza é como me senti quando soube que Rob Reiner estava morto: uma combinação de tristeza e incredulidade. Quanto ao resto… Robert Stone estava certo quando disse que “a mente é um macaco”.
Acho que vi Conta Comigo no outono de 1985. Naquela época, o filme ainda se chamava O Corpo, que era o nome da minha novela, na qual o filme de Rob foi baseado. Acho que ele me mostrou o filme em uma sala no Beverly Hills Hotel com uma banda de rock ‘n’ roll tocando ritmos fortes em algum lugar distante. Aquela banda era puro anos 80. O filme me permitiu entrar em outra época, mais inocente: 1959.

Filme ‘Conta Comigo’, de 1986, foi dirigido por Rob Reiner a partir de história de Stephen King Foto: Columbia Pictures/Divulgação
Tenho quase certeza de que Rob estava vestindo uma camisa xadrez de manga curta e calças cáqui, como se tivesse acabado de sair do campo de golfe. (Pelo que eu sabia, talvez tivesse mesmo.) A única coisa de que tenho absoluta certeza é que ele ficou por perto até o filme começar a rodar e depois saiu da sala. Mais tarde, ele me disse que não suportaria ver minha reação se eu não gostasse. Eu era uma plateia de um só, sentado em uma cadeira de encosto alto surrupiada de uma das salas de reunião do hotel.
Fiquei surpreso com o quão profundamente fui afetado por aqueles 89 minutos. Eu escrevi muita ficção, mas O Corpo continua sendo a única história abertamente autobiográfica que já fiz. Aqueles garotos eram meus amigos. Nunca caminhamos por trilhos de trem para ver um cadáver, mas fizemos outras coisas. A história era sobre a minha realidade, como eu a tinha vivido nas estradas de terra do sul do Maine. Existia mesmo um cão de guarda no ferro-velho, embora seu nome não fosse Chopper. Existiu mesmo um garoto que foi nadar e saiu coberto de sanguessugas em áreas surpreendentes, mas não era Gordie Lachance; era eu.
E existiu mesmo um garoto que foi acusado de roubar dinheiro do leite, embora seu nome não fosse Chris Chambers. Ele pegou emprestado — não vamos chamar de roubo — o Bel Air de sua mãe. Comigo no banco do passageiro (o “carona”), ele o dirigiu a 90 milhas por hora pela Rota 9 em nossa cidade rural. Tínhamos 11 anos.
O que estou dizendo é que, nas mãos de Rob, tudo soou verdadeiro. As partes engraçadas eram realmente engraçadas (incluindo o barf-o-rama [a cena do vômito em massa]) e as partes dramáticas me atingiram onde eu vivia, ou onde eu vivi na época em que John F. Kennedy era presidente e a gasolina custava um quarto de dólar o galão.
Eu me senti exatamente assim, dividido entre a vida de escritor e a vida dos meus amigos, que estavam vivendo o momento e não iriam a lugar nenhum em particular, exceto talvez o Vietnã. Eu escolhi a escrita, mas foi por pouco.
Quando o filme acabou, agradeci a Rob e surpreendi a mim mesmo dando-lhe um abraço. Eu não sou um homem de abraços, e não acho que ele estivesse acostumado a recebê-los. Ele enrijeceu, murmurou algo sobre estar feliz por eu ter gostado, e nós dois nos afastamos.
Aparentemente, eu não tinha terminado de sentir meus sentimentos. Fui para o banheiro masculino mais próximo e fiquei sentado em uma cabine até conseguir me controlar. A nostalgia pode ser perigosa quando está tão perto. Eu não sei exatamente o que quero dizer com isso, mas parece ser verdade.

Robe Reiner dirigiu ‘Conta Comigo’ e ‘Louca Obsessão’, filmes baseados nos livros de Stephen King Foto: Michael Tran/AFP
Quando voltei do banheiro, Rob e eu tivemos uma conversa mais normal. Ele me pediu anotações; eu não tinha nenhuma. Eu apenas tinha deixado a coisa toda me envolver. Eu me maravilhei com a ótima história que a verdade poderia render nas mãos certas.
Anos depois, Rob organizou uma exibição de Louca Obsessão, que também foi baseado em um dos meus livros. Fiquei igualmente encantado com aquele filme, mas não tão emocionalmente destruído. O que eu gostei — o que Rob ousou capturar — foi a mistura de humor e suspense. Quando Annie Wilkes, perfeitamente retratada por Kathy Bates, diz a Paul Sheldon que o champanhe que eles beberão é “Dom Per-IG-non”, é engraçado e tocante: essa mulher nunca teve ninguém para lhe ensinar a pronúncia correta. Rob capturou isso perfeitamente.
Muito mais tarde, depois que Rob se tornou um autor e eu me tornei o que quer que eu tenha me tornado, nos encontramos em Nova York. A pedido dele, participei de um documentário político sobre o quão pouco gostávamos de Donald Trump. Rob recebeu muitas críticas e insultos no Twitter por isso, com sua graça habitual. (Eu me recuso a chamá-lo de X; isso é coisa para filmes pornográficos.) Ele foi uma presença política, um comentarista social e um satirista perverso. Mas tudo isso ainda empalidece para mim quando assisto a Chris Chambers dizer ao choroso Gordie Lachance: “Você vai ser um grande escritor um dia.”
Aquele garoto que chorava era eu. Foi Rob Reiner quem o colocou na tela.
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