Assista ao trailer de ‘Pluribus’, nova série do criador de ‘Breaking Bad’
Série é estrelada por Rhae Seehorn, e tem produção de Vince Gilligan. Crédito: Reprodução/YouTube/Apple TV
Não foi por acaso que Pluribus se tornou a série mais assistida da história da Apple TV. A trama desenvolvida por Vince Gilligan, criador de Breaking Bad e Better Call Saul – dois marcos da Era de Ouro Moderna da TV americana –, além de ser muito envolvente, é capaz de apresentar discussões originais mesmo se inspirando em contextos já explorados no cinema e na televisão. O episódio final da 1ª temporada vai ao ar na quarta-feira, 24, véspera de Natal.
E o que explica o apelo por Pluribus? Primeiramente, a conjuntura pós-apocalíptica costuma ter enorme adesão popular. Isso é fato desde o sucesso da série de zumbis The Walking Dead (e seus derivados). Mais recentemente, The Last of Us também surfou essa onda com um universo de pessoas infectadas por um fungo letal. Mas Pluribus vai além: não coloca o fim da humanidade como centro do espetáculo, e sim como pano de fundo para uma reflexão mais ampla sobre coexistência e individualidade. A tensão do programa é construída a partir de dilemas morais e oferece uma visão madura sobre o futuro, propondo um equilíbrio entre pessimismo e otimismo.

O episódio final da 1ª temporada da nova produção de ‘Pluribus’ vai ao ar na sexta-feira, 26, após o Natal, na Apple TV Foto: Apple TV/Divulgação
Nossa protagonista não é um anti-herói aos moldes do professor/traficante Walther White ou do advogado picareta Saul Goodman, aqueles homens de orgulho ferido que almejavam ego e poder e esbarravam sempre em si mesmos. Pelo contrário: Carol Sturka, vivida magistralmente por Rhea Seehorn, é a heroína improvável desse universo onde a felicidade é aterrorizante.
Escritora de sucesso e aparentemente sem grandes problemas, Sturka faz parte do seleto grupo de pessoas imunes a uma espécie de vírus alienígena – uma “cola psíquica” – que transformou os humanos em seres robóticos, amigáveis e que compartilham uma mesma consciência. Ela é uma mulher lésbica, cínica (com tiradas hilárias), explosiva e que não aceita o novo estado do mundo. Seehorn, aliás, recebeu o roteiro de presente do criador, que deseja tornar a atriz uma estrela após se encantar com atuação dela em Better Call Saul, na pele da durona Kim Wexler.
‘Pluribus’ vem do latim e significa literalmente “de muitos” ou “entre muitos”. Ela é mais conhecida por fazer parte da expressão E pluribus unum, que se traduz como “de muitos, um” – lema tradicionalmente associado aos Estados Unidos, que faz referência ao fato de que o país é formado por 50 estados que operam em conjunto. Logo, a ideia representa a uniformidade provocada pelo vírus.
Vince Gilligan, criador de ‘Breaking Bad’, orienta Rhea Seehorn durante as gravações de ‘Pluribus’ Foto: Divulgação/Apple TV
É fácil identificar a influência de filmes como Eles Vivem (1988), que reflete em Pluribus uma crítica à alienação social, ou de O Show de Truman (1998), ao reverberar a ideia de uma realidade manipulada e vigiada, e até do suspense de O Iluminado (1980), trazendo o temor do isolamento psicológico. A série de Gilligan bebe de todas essas fontes, mas sem recorrer à nostalgia direta ou a referências explícitas, adotando abordagem que conversa com os problemas do mundo atual, como o autoritarismo político e a ascensão da inteligência artificial.
É preciso falar sobre o cenário árido de Albuquerque, no Novo México, onde Carol reside. A cidade, que fora explorada em Breaking Bad e Better Call Saul, funciona quase como um personagem. A semelhança não é apenas geográfica, mas dramática e simbólica. O ambiente seco, vasto e aparentemente vazio reforça os dilemas morais e evita glamourizações ou distrações, além de sugerir a ausência de regras e de proteção.
Os nove episódios, aos quais o Estadão assistiu antecipadamente a convite da Apple, se desenrolam sem pressa, quase em resistência ao desejo do espectador por alívio ou resolução. Nós sentimos cada silêncio, cada gesto e cada fratura emocional de Carol naquele universo esquisitíssimo. Desta forma, a lentidão narrativa não é simplesmente “enrolação” ou “encheção de linguiça” de Gilligan, como alguns haters apontaram, mas um dispositivo de empatia, para que possamos sentir uma jornada dolorosa e sem atalhos fáceis.
É claro que ainda que teremos um longo caminho pela frente. Gilligan afirmou que pensa em fazer quatro temporadas para concluir a história. Mas a trilha inicial que foi pavimentada já aponta para um rumo brilhante.


