Quando foi disputar a final da nova modalidade de 1km contrarrelógio no Mundial de Paraciclismo, Sabrina Custódia tomou um susto. A suíça Flurina Rigling havia quebrado o recorde mundial, em um tempo que a brasileira jamais tinha batido em treinos.
“Agora eu tenho que lutar pelo menos pela medalha de prata”, conta ao Estadão sobre o que pensou na hora da disputa. Quando o relógio iniciou a contagem, Sabrina deu a largada e só parou 1m20s020 depois, 279 milésimos de segundos mais rápida que Flurina Rigling.
“Na hora em que vi o meu tempo, que foi bem parecido com o dela, só mudou 300 centésimos a menos, eu não acreditei”, diz Sabrina, que ainda acumulou duas pratas e um bronze no Mundial disputado no Rio, em outubro.

Em Paris, Sabrina Custódia foi finalista nos 500m contrarrelógio; agora, ela defende o recorde mundial no 1km. Foto: Alessandra Cabral/CPB
Na competição, Sabrina ainda ficou em quarto no sprint misto. Os resultados a deixaram no segundo lugar na categoria C2, atrás de Flurina Rigling. A C2 do paraciclismo engloba atletas que competem em bicicletas convencionais (C-Cycle), mas que possuem um nível moderado de comprometimento físico. A escala vai de 1 a 5, em que 1 representa o maior comprometimento.
Sabrina Custódia ainda venceu o Prêmio Paralímpicos 2025, do Comitê Paralímpico Brasileiro (CPB), na categoria ciclismo. A temporada coroa um desempenho que não é de hoje. No Mundial de 2023, na França, a paraciclista já havia conquistado a primeira medalha do Brasil na modalidade (a prata nos extintos 500m contrarrelógio).
“Na verdade, a gente não esperava (o recorde). No ano passado, eu já tinha sido medalha de prata. E eu tinha me machucado, estava com a clavícula quebrada de uma queda na pista. Tive de operar, veio Paralimpíada. Pensamos que precisávamos acertar algumas coisas”, conta.
Sabrina Custódia nega estigma da deficiência e vê avanço no esporte paralímpico
Após o acidente que fez com que Sabrina tivesse amputados das duas mãos, o pé direito e os dedos do pé esquerdo, no começo dos anos 2000, ela iniciou no paratletismo, mas não via chances de competir.
“Fiquei no atletismo por 10 anos, treinando, focada, porém, eu não consegui ter resultados tão expressivos. O meu maior sonho era poder participar de um mundial, de uma para-olimpíada, representar o meu país. No atletismo, eu via que estava longe“, lembra.
Foi então que migrou ao paraciclismo, com apoio do marido, Adriano Matunaga, que já pedalava. Adriano também é paratleta e foi quarto colocado no triciclo masculino do ParaPan de 2023.

Adriano Matsunaga, marido de Sabrina, atua como técncio da ciclista. Foto: Alessandra Cabral/CPB
“O esporte paralímpico está evoluindo bastante. Não só no ciclismo, mas de modo geral e a visão de outras pessoas, empresas, patrocínios, está cada vez melhorando mais, evoluindo. Faz completamente toda a diferença a gente ter um patrocínio, como do time São Paulo, que ajuda muito na nossa vida, principalmente para esportes que são caros, como o ciclismo”, avalia Sabrina
O Time SP citado pela ciclista é uma iniciativa do Governo do Estado de São Paulo para patrocinar atletas e paratletas. Por meio da Secretaria de Estado dos Direitos da Pessoa com Deficiência (SEDPcD), foram repassados R$ 8 milhões a 154 atletas de 17 modalidades.
Sabrina vê esse tipo de apoio como fundamental. “Algumas vezes a gente precisa de algo que é mais muito caro e a gente tem que tirar (do bolso) ou às vezes é viagens também. No ciclismo, a gente tem Copas do Mundo, que a maioria das vezes são na Europa. As bolsas, os patrocínios, eles ajudam bastante, mas tem meses que acaba ficando um pouquinho mais apertado e aí a gente acaba tirando um pouquinho do nosso”, relata.
“O ciclismo se move pelo ranking mundial, que é por pontos. Então, se eu não participar dessas competições para estar lá e pontuar, ter a melhor pontuação, no ranking eu acabo ficando bem longe, bem lá embaixo”.
Sabrina acredita que não sofrer com rótulos negativos. Ela tenta reverter um possível estigma e reafirma que é maior do que deficiência.
“Muitas pessoas têm essa visão, porque antigamente as pessoas com deficiência não faziam muita coisa, não trabalhavam, não praticavam esporte. O mundo está mudando. As pessoas acabam vendo como superação, como motivação. E eu acho super normal ter essa visão, e a gente poder motivar. Eu fico super feliz de receber uma mensagem falando que inspirei uma pessoa.”


