Crises políticas em clubes de futebol costumam acompanhar derrocadas capazes de derrubar gigantes. Corinthians e Vasco, cada a uma à sua maneira, precisaram driblar turbulências internas para, contra as expectativas, se classificarem à final da Copa do Brasil. Independentemente de quem ficar com o título, que será decidido neste domingo, no Maracanã, o campeão será coroado após brusca correção de rota em ambos os lados do confronto.
Poucos clubes atravessaram crises tão acentuadas como o Corinthians nos últimos dois anos. A ruptura com o grupo de Andrés Sánchez, que ficou, 16 anos no poder, não poderia ter sido mais traumática. O ex-presidente Augusto Melo acabou impichado por irregularidades no contrato com a Vai de Bet, antiga patrocinadora máster do clube. O tema virou caso de polícia, que concluiu que parte do dinheiro envolvido no negócio foi parar nas mãos do crime organizado. Tanto o ex-mandatário como outros dois diretores de sua gestão respondem criminalmente.

Osmar Stábile assumiu a presidência do Corinthians após o impeachment de Augusto Melo. Foto: Taba Benedicto/ Estadão
O escândalo Vai de Bet causou inúmeras entradas e saídas de dirigentes até a saída em definitivo de Melo, que ainda tentou recorrer da decisão interna na Justiça, mas sem sucesso. O vice Osmar Stábile assumiu o cargo e atuou na blindagem do Centro de Treinamento Joaquim Grava, com o intuito de evitar que a crise política contaminasse o elenco. Em junho, o meia Rodrigo Garro, um dos líderes do plantel, admitiu que os jogadores do Corinthians não conseguem ficar completamente alheios aos problemas do clube.
“A guerra política do Corinthians, infelizmente, atrapalha, atrapalha o nosso trabalho. Mas dentro do CT a gente tem um clima muito bom, o grupo está fechado. Não é que a gente perde ou deixa de ganhar com a guerra política. Não tem a ver com isso”, comentou o meia à época.
Os problemas no Corinthians se agravaram com o aumento expressivo da dívida total, que atualmente é de R$ 2,7 bilhões. A diretoria tem dificuldade para honrar compromissos a curto prazo e busca novas fontes de receita. Para piorar, o clube foi punido com transfer ban da Fifa e está impossibilitado de registrar novos jogadores dede setembro. Os paulistas somam mais de R$ 120 mi em condenações pelo não pagamento em negociações de transferências envolvendo os jogadores Félix Torres, Matías Rojas, Maycon e Rodrigo Garro.
O momento ruim do clube refletiu nas eliminações na pré-Libertadores e Sul-Americana, além da campanha ruim no Brasileiro, com o 13º lugar. Para evitar um cenário de debandada, a diretoria comandada por Stábile focou em honrar os salários mensais e não se envolver no departamento de futebol, que fica à cargo do executivo Fabinho Soldado e do técnico Dorival Júnior, contratado em abril depois dos resultados ruins com Ramón Díaz.
Apesar de uma temporada abaixo da crítica, o Corinthians deu uma resposta ao torcedor toda vez em que o time se mobilizou, vencendo o Paulistão derrotando o Palmeiras na final — também eliminando o rival das quartas da Copa do Brasil — e vencendo confrontos importantes, como a semifinal contra o Cruzeiro.
Do vácuo de liderança à final da Copa do Brasil
Vencer a Copa do Brasil terá um simbolismo importante para o torcedor do Vasco. Seria o primeiro título de grandeza nacional do clube após a era Eurico Miranda, ex-presidente e figura histórica do clube que exerceu forte influência desde a década de 1980 até a sua morte, em 2019. O caos político que culminou em cinco participações na Série B no século 21 ganhou novo contorno após a parceria frustrada da 777 Partners no controle da SAF cruz-maltina.
A relação com a 777, que assumiu o controle da SAF em 2022 com a promessa de estabilidade financeira e profissionalização da gestão, rapidamente se deteriorou. Atrasos em aportes e decisões estratégicas questionadas alimentaram conflitos internos e externos. O impasse culminou em disputas judiciais e na perda de poder da empresa sobre o futebol, expondo o Vasco a um vácuo de liderança. Em janeiro de 2024, o ex-jogador Pedrinho tornou-se presidente, inicialmente apenas para cuidar de funções que não estavam relacionadas com o futebol, mas logo o cenário mudou.

Pedrinho, presidente do Vasco, durante a apresentação de Phillipe Coutinho em São Januário. Foto: Leandro Amorim/Vasco
Com a crise da 777 instalada, Pedrinho agiu sob o pretexto de evitar um colapso esportivo e retomou o controle do futebol na Justiça — o clube alegou o aumento da dívida total para R$ 1,4 milhão. O movimento devolveu ao Vasco uma sensação mínima de ordem apesar das dificuldades financeiras.
Dentro das quatro linhas, Pedrinho conseguiu dar certa estabilidade no departamento de futebol com a contratação de Fernando Diniz, em maio, treinador a quem sempre admitiu publicamente ter admiração. O comandante cruzmaltino não teve vida fácil ao lidar com um elenco limitado, mas dispõe de peças importantes que ajudou a dar competitividade ao Vasco no mata-mata da Copa do Brasil. Nomes como o goleiro Léo Jardim, o lateral-direito Paulo Henrique (convocado à seleção brasileira), o promissor Rayan e, o artilheiro Pablo Vegetti e, claro, Phillipe Coutinho foram cruciais para a campanha até a decisão.
Vasco e Corinthians se enfrentam neste domingo, às 18h, no Maracanã, pelo segundo jogo da final da Copa do Brasil. Depois do 0 a 0 na partida de ida, na Neo Química Arena, uma nova igualdade no placar levará a decisão para os pênaltis.


