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Livros para presentear no Natal: 10 livreiros indicam seus favoritos
De Elvira Vigna e LiraNeto a Simone AZ e Ágota Kristóf, lista traz sugestões de presente – e de leitura por quem mais entende do assunto. Crédito: Talita Facchini/Laís Nagayama
Por razões literárias e psiquiátricas, o Natal talvez seja o feriado mais explorado pelos ficcionistas. Familiares reunidos e ébrios oferecem material farto para a fabulação. Dentre os exemplos mais conhecidos, estão as investidas de Charles Dickens e Mário de Andrade. O primeiro nos deu o celebérrimo Uma canção de Natal (trad.: Rodrigo Lacerda, Penguin Companhia), e o paulistano é autor de O Peru de Natal (Contos Novos, Nova Fronteira), um dos pontos altos do modernismo. Recensear as narrativas curtas situadas nessa época do ano seria contraproducente. Assim, peço licença a São Nicolau e escolho três dessas histórias.
A primeira delas é Nas Festas de Natal, do russo Anton Chekhov (em Últimos Contos, Todavia, trad.: Rubens Figueiredo). O conto é um exemplo primoroso do estilo do autor, que trabalhava por meio da alusão e da sutileza, escrevendo com uma clareza que nada tem de simplória. A sofisticação de Chekhov (1860-1904) reside na forma como ele sublinha os ruídos entre o que (não) é dito e o que sentem os personagens. As palavras não expressam as sensações dos indivíduos, seja porque estes não possuem o vocabulário para tanto, seja porque as convenções e coerções sociais não permitiriam isso.
O conto estabelece o que Rubens Figueiredo chama de “tensão interna e insolúvel”: sua aparente incompletude e o final brusco salientam o que expressa. Se tivesse uma “resolução” convencional, o conto trairia a si mesmo. E o que acontece nele? A filha de camponeses se mudou para São Petersburgo com o marido e não manda notícias há anos. Analfabetos, os pais recorrem a um escrevedor de cartas que os ignora e deita uma saraivada de asneiras no papel; ademais, a mãe se vê incapaz de exprimir tudo o que quer. Na segunda parte da narrativa, a carta chega às mãos da filha e compreendemos as razões de seu suposto silêncio. Tudo sem qualquer sentimentalismo.

Man Reading a Book While Sitting on the Sofa at Christmas Near the Tree. Foto: Polonio Video/Adobe Stock Foto: Polonio Video/Adobe Stock
Uma Conversa Séria, de Raymond Carver (68 contos, Companhia das Letras, trad.: Rubens Figueiredo), é uma história sobre términos e ressentimentos. Separado da esposa e dos filhos, homem faz uma visita (pouco) natalina, mas é informado de que precisa “ir embora às seis horas”, pois o “amigo” da mulher irá “com os filhos para jantar”. Assim escanteado, o macho age como se espera dele: infantilmente. Depois, quando volta para se desculpar, piora ainda mais as coisas e a conversa séria do título é sempre adiada, pois todos carecem de maturidade para sustentá-la.
O estilo direto de Carver (1938-1988), influência de Chekhov, transforma esse conto suburbano em uma tragicomédia com a qual nos identificamos. A dor que perpassa a narrativa contamina os objetos, e alguns deles (em especial o cinzeiro que não é cinzeiro) como que simbolizam as sensações de raiva e abandono. Em tempo: a versão estendida do conto (antes de sofrer os cortes do editor Gordon Lish) está no volume Iniciantes (mesmos tradutor e editora) com o título Torta. As duas versões são excelentes.
Por fim, recomendo O Natal é Uma Época Triste Para os Pobres, de John Cheever (28 contos, Companhia das Letras, trad.: Jorio Dauster e Daniel Galera). Obrigado a trabalhar no dia de Natal, um ascensorista reclama com os moradores ricos do prédio e, comovendo-os nem sempre de forma honesta, acaba recebendo muito mais do que esperava.
É claro que a situação se torna insustentável, mas o que Cheever (1912-1982) ressalta com seu humor característico é a persistência da caridade: “Uma luz beatífica recobriu seu semblante quando ela percebeu que poderia doar, levar alegria aos outros, remediar um caso pior que o dela”. Ainda que tal sensação seja ironizada (pois é “uma sensação de poder”), aqueles que se beneficiam dela continuam acolhidos e presenteados. E, de uma forma ou de outra, é essa “generosidade irrestrita” que o Natal deveria inspirar, não?
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