“Google, quantos discos foram lançados em 2025?”, pergunto. “Impossível responder a essa questão, mas sabe-se que chegaram ao mercado centenas de milhares de álbuns e singles no ano de 2025”, me responde a ferramenta de busca. A mesma que, aliás, me informa que as plataformas de streaming recebem, diariamente, cerca de 120 mil novas canções.
Diante desse cenário, a ideia de apresentar os discos e os artistas que se destacam neste ou naquele ano nasce mais das técnicas de investigação utilizadas – que nos faz sentir uma mistura de Colombo com Indiana Jones (sim, eu sou vintage) – do que prestar atenção a tudo o que nos é indicado pelas playlists das plataformas de streaming. No meu caso, a melhor indicação parte da dica dada por amigos e/ou jornalistas que conheço e respeito e depois pela avaliação que eu mesmo faço do trabalho.

Álbuns de Rosalía, Seu Jorge e Zeca Veloso estão entre os melhores do ano para o colunista Sergio Martins Foto: Divulgação
Baseado nesse critério, creio que 2025 foi um ano e tanto para a música – isso, claro, para quem desconfia da sucessão de ídolos que só existem no universo das redes sociais. Houve uma série de destaques tanto no showbiz nacional quanto internacional, dos mais diferentes estilos e gerações. Aqui estão os meus escolhidos, sem ordem de preferência. Vamos a eles?
Nacional
Zé Ibarra – Afim
O cantor de 29 anos participou dos grupos Dônica e Bala Desejo, além de ter brilhado na turnê A Última Sessão de Música, de Milton Nascimento. AFIM, seu segundo disco solo, me encantou de várias maneiras: o espaço dado aos seus contemporâneos (apenas três das oito canções do disco são da autoria de Ibarra, as outras cinco são assinadas por Sophia Chablau, Maria Beraldo, Ítallo França e Tom Veloso) e a diversidade do repertório. Há samba introspectivo e canção inspirada no indie rock ao pop sofisticado que lembra Marina Lima dos anos 1980.
O que escutar: Essa Confusão
Chico Chico – Let It Burn/Deixa Arder
É o terceiro disco do cantor e compositor carioca, filho de Cássia Eller. O mérito de Let it Burn reside no fato de ser um trabalho muito mais focado. O blues e o folk –americano e brasileiro– são a espinha dorsal do álbum. O gênero surgido às margens do rio Mississipi reside, por exemplo, em canções como Tempo de Louças e Zero Jogo e Two Mother’s Blues. No universo do folk, Chico explora desde recriações de Zé Ramalho e Crosby, Stills, Nash & Young (Vila do Sossego, 4 + 20) à parceria com a cantora Josyara em Parabelo da Existência.
O que escutar: Tempo de Louças
Zeca Veloso – Boas Novas
A exemplo de Chico Chico, este cantor e compositor carioca é um caso do “nepotismo do bem” (termo criado por Nelson Motta para definir filhos de astros da música que herdaram a musicalidade dos pais). Zeca era uma das atrações do show/disco Ofertório, ao lado do pai Caetano e dos irmãos Moreno e Tom. Todo Homem, canção que interpretava ao piano e com registro vocal em falsete, era um dos pontos altos do espetáculo. Boas Novas é um trabalho calcado no groove (ou boogie, como prefere chamar) e de alta sofisticação sonora. Há uma clara influência do pai –como se pode ver em Salvador– somado a Máquina do Rio e Desenho de Animação, que remete às bandas cariocas do movimento Black Rio.
O que escutar: Salvador
Seu Jorge – Baile À La Baiana
Primeiro disco de estúdio do cantor e compositor carioca em quase uma década, Baile à La Baiana propõe uma conversa entre os suingues carioca e baiano. Há muito de Tim Maia (1942-1998) e Jorge Ben Jor em canções como Sábado à Noite, Sim Mais e Batuque, faixas iniciais do álbum. O disco, no entanto, se aprofunda na mistura do cancioneiro desses dois estados a partir da reunião com os cantores e percussionistas Magary Lord e Peu Meurray. O pop baiano –que vai desde a chamada axé music às influências dos caribenhos salsa e merengue– se faz presente a partir de Chama o Brasil pra Dançar.
O que escutar: Sábado à Noite
Vanessa Da Mata – Todas Elas
A cantora e compositora mato-grossense gosta de afirmar que prefere oferecer escargot a se limitar a fazer o arroz com feijão de sempre –ainda que bem feito. Todas Elas, nesse caso, se aproxima a um ótimo risoto, feito de bons ingredientes –o afrobeat, a disco music, o soul e o jazz além, claro, das diversas vertentes da MPB. Um trabalho que fala sobre o preconceito contra as mulheres e as religiões de matriz afro-brasileira (Maria Sem Vergonha e Eu Apoio a Sua Fé) e letras que se assemelham a crônicas–Um Passeio com Robert Glasper Pelo Brasil, que narra seu encontro com o pianista americano de jazz.
O que escutar: Maria Sem Vergonha
Internacional
José James – 1978: Year Of The Dragon
O jazzista americano é uma alma inquieta, que pode tanto lançar um tributo a Billie Holiday (o estupendo Yesterday I Had the Blues, de 2015) a buscar inspiração no hip hop, na soul music e no funk. Year of the Dragon faz referência ao ano de 1978 e às sonoridades típicas daquele período –em especial, claro, à disco music. Rock With You, sucesso de Rod Temperton eternizada por Michael Jackson, ganha um acento jazz/disco, enriquecida pelo trompete de Takuya Kuroda. A receita de James inclui ainda Mick Jagger e Keith Richards (Miss You), Bee Gees (Inside and Out) e uma canção de uma das fases mais dançantes do jazzista Herbie Hancock (I Thought it Was You), além de músicas de autoria do próprio James.
O que escutar: Rock With You
Tedeschi Trucks Band – Tedeschi Trucks Band & Leon Russel Present: Mad Dogs And Englishmen Revisited Live At Lockin’
Mad Dogs and Englishmen foi uma turnê/disco criada pelo cantor Joe Cocker (1944-2014) e pelo pianista Leon Russell (1942-2016) que reunia cerca de vinte músicos e cantores para apresentar uma mistura de rock, blues, soul e gospel. Um dos maiores fracassos financeiros de Cocker, ele rendeu um disco e um filme sensacional. Em 2015, a guitarrista e vocalista Susan Tedeschi e seu marido, o guitarrista Derek Trucks, se uniram ao Russell para recordar esses shows memoráveis. Não se trata de fazer covers daquele repertório, mas sim recriar a euforia presente naquelas apresentações. Mais do que versados na escola do blues, do soul e do southern rock, Susan e Derek apresentam um trabalho memorável.
O que escutar: With a Little Help from My Friends
Steven Wilson – The Overview
O guitarrista, cantor e produtor é um dos ícones do atual rock progressivo –seja à frente do Porcupine Tree, banda que ele criou em 1987, ou na carreira solo, onde explora desde o universo erudito ao pop. The Overview é um disco conceitual (duas faixas em pouco mais de 41 minutos), inspirado no efeito que acomete os astronautas ao verem o Planeta Terra do espaço. A partir do tema, Wilson apresenta uma coleção de suítes que podem ir do rock de arena ao pop e à música eletrônica.
O que escutar: Perspective
Rosalía – Lux
A ideia de unir a ópera à música pop nem é tão nova e gerou trabalhos frustrantes como Barcelona, de Freddie Mercury com a soprano Montserrat Caballé. Rosalia, claro, passa longe dessas armadilhas. Lux é um disco ambicioso, com arranjos orquestrais e letras cantadas em treze idiomas diferentes. Ao mesmo tempo, ele conserva o frescor da música pop (ainda que diluída em meio às experiências sonoras da cantora). As letras abordam temas como Deus, destino e questionam se existe algum significado para a nossa existência. Um trabalho de uma popstar conectada com seu tempo.
O que escutar: Berghain
Geese – Getting Killed
Este grupo do Brooklyn, em Nova York, conquistou meus ouvidos recentemente. E dali não saiu mais. Liderado pelo vocalista e guitarrista Cameron Winter (que, inclusive estará na edição de 2026 do C6 Fest), ele traz diversas influências de artistas de gerações anteriores –há quem escute ecos de Radiohead e Anthony & the Johnsons – acrescidas de um andamento que estão longe do convencional e letras repletas de ironia. “Todas as pessoas devem sorrir em tempos de guerra”; “Estou sendo morto por uma vida muito boa”, diz a faixa-título.
O que escutar: Cobra


