
Guilherme Affonso Ferreira, Alfredo De Goeye, Ayres Britto, Gustavo Franco e Felipe D’Ávila aprovam ideia de Fachin Foto: Colagem de Thais Barroco sobre fotos de Fabio Motta, Tereza Sá, Acervo Estadão, divulgação e arquivo pessoal
A discussão sobre um Código de Ética para ministros do Supremo Tribunal Federal ganhou a rua nos últimos dias. A proposta discutida nos bastidores do STF pelo presidente da Corte, ministro Edson Fachin, provocou reação imediata: empresários, economistas e profissionais de diferentes áreas decidiram apoiar publicamente a medida e assinaram um manifesto em defesa do projeto.
A iniciativa começou com 200 assinaturas, ganhou força e já tem quase 9 mil signatários. Na última sessão da Corte, na sexta, 19, Fachin falou pela primeira vez abertamente sobre a medida e disse que “a transparência e a prestação de contas não são opcionais, mas deveres inerentes ao Estado Democrático de Direito”.
Hoje, o Tribunal opera sem um código específico para seus ministros. É uma exceção brasileira: universidades, empresas, bancos, ONGs, conselhos e governos trabalham há anos sob normas claras de integridade.
No STF, não há regras públicas que tratem de temas como conflitos de interesse, relação com escritórios de advocacia, viagens financiadas por terceiros ou vínculos familiares com partes envolvidas em processos. Fachin quer mudar isso. Disse que já tratou do tema com integrantes da Corte e com dirigentes de outros tribunais superiores. A proposta dialoga com experiências de outros países, como o código de conduta do Tribunal Constitucional da Alemanha.
À Coluna, o ministro aposentado do STF, Carlos Ayres Britto, vê a proposta como a afirmação de algo que já está na Constituição brasileira: “O código de ética é intrinsecamente relevante. Nada mais natural do que exigir dos ministros uma conduta pautada por critérios rigorosamente éticos, já que a Constituição determina, desde o artigo 101, que só pode assumir o cargo quem tiver reputação ilibada — isto é, reputação sem mancha, conceito ético absoluto”.
Ele lembra que a própria arquitetura constitucional sustenta a iniciativa:
“A administração pública deve seguir legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. Está no artigo 37. Se esses princípios são exigidos de todo agente público, também devem ser seguidos pelos ministros do Supremo. Por isso, colocar isso por escrito, preto no branco, é melhor ainda”.
E conclui: “Sou totalmente a favor. Fachin merece aplauso. Um exemplo vale mais do que mil metáforas — e o Supremo precisa ser exemplo. Pedir um código de ética não é estranheza; é apenas traduzir a Constituição”.
O movimento
A Coluna também foi entender o movimento civil “Por um código de conduta no STF JÁ!” e ouviu quatro signatários do manifesto. Eles explicam por que consideram o código necessário e o que esperam que represente para o futuro do Supremo.
Gustavo Franco
Para o economista e ex-presidente do Banco Central, causa estranhamento que a proposta encontre resistência dentro do próprio Tribunal. Ele lembra que códigos de ética são um padrão básico no País e no mundo corporativo. “Parece haver resistência à ideia do ministro Fachin. Não deveria haver. É difícil achar um estabelecimento no Brasil que não tenha um código de ética”. Sua motivação para assinar o manifesto foi objetiva: “O manifesto é apenas um pequeno sopro na direção que me pareceu correta.
Guilherme Affonso Ferreira
O empresário e conselheiro de grandes companhias enxerga o código como uma resposta ao desejo de equilíbrio entre os Poderes — e como proteção ao próprio Tribunal. “Acredito na democracia e acho que temos a obrigação de preservá-la. Uma democracia se baseia no equilíbrio entre Executivo, Legislativo e Judiciário. Os dois primeiros se renovam pelo sufrágio; já o Judiciário exige notório saber jurídico validado pelo Senado. Estamos assistindo, na visão da sociedade, a abusos de alguns ministros. Verdade ou não, um código de conduta traria autenticidade ao Supremo. Participei de mais de 30 conselhos de empresas abertas e todas possuem códigos próprios. É saudável que a sociedade apoie essa iniciativa, ainda mais porque nasceu dentro do STF, por Fachin”.
Alfredo de Goeye
Para o presidente e fundador da Sertrading, a discussão não deveria ser polêmica — o Supremo apenas adotaria o padrão ético que o País já exige de qualquer instituição relevante. “A criação de um Código de Ética é importante para trazer legitimidade que não seja subjetiva. Assinar o manifesto foi uma forma de participar de uma causa justa, posicionando-me a favor do coletivo”.
Felipe D’Ávila
Já para o cientista político e escritor, o código serviria para tirar do ar dúvidas e suspeitas que desgastam a imagem do Tribunal. Ele fala em recuperar a confiança do País na Corte. “O manifesto mostra que a sociedade e o Supremo estão preocupados com condutas de ministros que abusaram da ética. Há episódios imorais envolvendo contratos e viagens.
Para uma Corte que zela pela Constituição, é fundamental restabelecer um código para evitar ataques por comportamentos antiéticos. Democracias avançadas já têm códigos semelhantes. Não é punitivo: é a velha história de César — não basta ser honesto, é preciso parecer honesto. Assinei porque é fundamental recuperar o senso de moralidade no Supremo”.
Discussão fica para 2026
Fachin deixou claro que não desistirá do debate e prometeu diálogo com a proposta que ainda está, segundo ele, em “gestação”. O objetivo é instituir o código até o fim do mandato dele na presidência, em setembro de 2027.


