Nando Reis fala sobre Cássia Eller: ‘Ela queria alguém que mostrasse quem ela era, e eu ajudei’

Foto: Felipe Rau/Estadão

Nando Reiscantor e compositor

Basta ouvir All Star, canção que Nando Reis fez para Cássia Eller (1962-2001), para perceber que a relação entre eles era de amor, no mais amplo sentido desse sentimento.

“Estranho seria se eu não me apaixonasse por você”, diz o primeiro verso. Lançada depois da morte de Cássia – a cantora morreu no dia 29 de dezembro de 2001 -, a música é uma das que estão no repertório do Corona Luau MTV 2025 Cássia Eller, show que será apresentado em São Paulo neste domingo, 21, no Parque Ibirapuera.

Nando conduz sua homenagem tendo como convidados no palco a cantora Céu, o trio Os Garotin e a percussionista Lan Lanh, que tocou na banda de Cássia e estava com a cantora em seus últimos momentos de vida. A apresentação é de Sarah Oliveira.

A escolha de Cássia para essa reedição do Luau MTV é mais do que justa. Foi o último programa que a cantora gravou, dez dias antes de sua morte. Na época, a MTV exibiu a atração no começo do ano seguinte, como um tributo à cantora.

Nando estava lá e, agora, acha pertinente que esteja também nesta nova celebração à obra de Cássia. “Tenho propriedade para apresentar essa fração do trabalho da Cássia”, diz. “Eu acho que isso é bom porque a Cássia Eller precisa ser conhecida”, completa o compositor, se referindo às novas gerações.

Em conversa com o Estadão, Nando, além de falar sobre o Luau – o show, gravado em Maresias, litoral de São Paulo, antes de sair em turnê, já está disponível no YouTube -, relembrou o tempo que produziu o álbum Com Você… Meu Mundo Ficaria Mais Completo, no qual Cássia experimentou uma maneira de cantar mais suave e se abriu para uma sonoridade mais diversa do que vinha apresentando até aquele momento.

Nando também responde sobre uma história que aparece na nova biografia de Cássia, Eu Queria Ser Cássia Eller. O autor, Tom Cardoso, afirma que a cantora teria sido obrigada a gravar a canção Palavras ao Vento, de Marisa Monte e Moraes Moreira, que faz parte deste álbum produzido por Nando. O cantor acha que, passados quase 30 anos da morte da amiga, a questão é irrelevante – a música se tornou um dos maiores sucessos da carreira dela.

“As pessoas se interessam muito por estas questiúnculas. O fato é que a música foi gravada, ganhou uma versão magnífica dela e permanece vivíssima”, diz.

Há uma geração que não a acompanhou em tempo real, que não a viu nos palcos, nos festivais, tão procurados atualmente. Neste sentido, o que o ‘Luau MTV’ pode contribuir para apresentar a música de Cássia Eller ao público mais jovem?

Eu acho que o Luau também era a marca de um programa que estava, digamos assim, inativo. Então, são duas associações que se justificam, justamente porque o programa que a Cássia fez no Luau MTV talvez tenha sido a última aparição dela na TV. Eles me convidaram justamente porque eu estava trabalhando com a Cássia nesse momento do Luau, no qual, inclusive, eu fui convidado a estar. Sou um artista que continua atuando, acho que meu nome é reconhecível para quem quiser acompanhar o meu trabalho e tenho propriedade para apresentar essa fração do trabalho da Cássia, que é o foco maior desse show do Luau. Eu acho que isso é bom porque a Cássia Eller precisa ser conhecida. Quem não conhece está marcando touca, tem que ouvir!

Os Garotin, com quem você está trabalhando pela primeira vez, tem uma leveza e uma felicidade no palco que muito se parece com o que Cássia gostava de transmitir também. Fale sobre esse encontro com eles, um trio jovem e com tantas referências musicais, algo fundamental para a profissão…

Está sendo maravilhoso. Eles são muito bons, temos uma ótima sintonia e afinidade no palco, que é um elemento sobre o qual não se tem muito controle, sabe? Você não decide essas afinidades, elas se dão por uma ordem misteriosa. Fizemos ensaios, a gravação do programa e dois shows. E, pelo pouco tempo de convivência, é surpreendente a força da relação, a espontaneidade com que ela se dá, a naturalidade. E acho que tem, sim, uma coisa que é semelhante a Cássia. A Cássia era uma pessoa com um grau de irreverência que é importante, né? Às vezes, o artista se leva muito a sério, e isso soa até um pouco patético.

O disco ‘Com Você… Meu Mundo Ficaria Mais Completo’ é o maior espelho da relação entre você e Cássia. É o que apresenta também a Cássia diferente, cantando mais suave, explorando mais possibilidades de arranjos e gêneros musicais. Por que foi importante, naquele momento, apresentar uma cantora diferente de que todos estavam acostumados a ouvir? E mais: como lidaram com as críticas por justamente fazerem isso?

Vou começar pelo final. Se houve críticas em relação a este disco, sobre este aspecto, elas são tão idiotas que não mereciam nem atenção. Eu já há muito tempo não dou bola para críticas. Então… nem me lembro!

Essa minha decisão — ou, digamos, a direção de apresentar a amplidão da Cássia, a amplitude do seu gosto — era algo quase óbvio. E isso foi ficando ainda mais claro a cada vez que eu a conhecia melhor no período de pré-produção deste disco. Todos os estigmas, ou categorizações, são sempre redutores, empobrecedores, burras mesmo. E para nós era natural, não se tratava de um conceito imposto, do tipo: ‘Ah, vamos fazer isso porque agora isso vai ficar legal’. Não. Era simplesmente olhar e ver o tamanho dela, quem ela era, e ouvir o que ela queria, né? E ela queria alguém que mostrasse quem ela era, e eu ajudei a fazer isso.

Acaba de sair uma nova biografia de Cássia Eller na qual o autor, Tom Cardoso, afirma que Cássia foi ‘praticamente obrigada’ a gravar ‘Palavras ao Vento’ no disco no qual você era o produtor. No livro, a insistência para que ela fizesse a gravação ora recai sobre você e Luiz Brasil [os produtores], ora sobre o Leonardo Netto [empresário de Cássia à época]. Qual sua versão para esse fato?